A própria fala de Haddad, durante a audiência na Câmara, é um exemplo de uma vez que o mecanismo tem funcionado. Ao tutorar que a inflação está sob controle, o ministro declarou que a meta de inflação para 2024 (e anos seguintes), de 3%, é “exigentíssima” e “inimaginável”. A fala, na visão do mercado, reforçou a teoria de leniência com a inflação, e. quase imediatamente, a cotação do dólar subiu, enquanto a curva dos juros futuros empinava.
O veste é que a leitura que o mercado financeiro está fazendo das condições da economia também pode ser qualificada uma vez que “exigentíssima”. Algumas razões:
A inflação não está caminhando para o meio da meta, mas roda numa filete benigna, inferior de 4% e mais próxima de 3,5%, folgadamente dentro do pausa de tolerância do sistema de metas, que, no limite superior, vai até 4,5%;
As metas fiscais perseguidas pelo governo parecem irrealistas, mas a intervalo das metas oficiais para as estimativas do setor privado não são tão distantes. Se o governo insiste em déficit zero, podendo chegar, pelas regras fiscais, a 0,25% do PIB, para 2024, especialistas em contas públicas apontam déficit de 0,7% do PIB. Zero impede que a diferença, de R$ 50 bilhões, seja compensada em qualquer momento do porvir próximo;
A atividade econômica não está crescendo quanto seria desejável, mas a perspectiva é de expansão em 2024 (e anos seguintes), mesmo depois da tragédia das inundações no Sul, em torno de 2%. No primeiro trimestre, o incremento previsto é de 0,7% sobre o quarto trimestre de 2023, é de 2,3%, na confrontação interanual. Ao mesmo tempo, o mercado de trabalho vive um bom momento, com absorvência de mão de obra, inclusive no segmento formal, com aumento da renda, enquanto o setor extrínseco, com ótimo desempenho, tende a limitar instabilidades cambiais.
O resumo da história é o que, se o pessoal da Faria Lima tem qualquer motivo para se preocupar com os rumos da economia, Haddad e o governo também podem se queixar de que uma leitura enviesada da verdade, que leva a um aumento sem base dos prêmios de risco dos ativos, cumprem uma profecia auto-realizável, prejudicando os esforços para fazer a economia deslanchar, de modo mais equilibrado e sustentável.