A Secretaria Municipal de Ensino de Mentor Lafaiete, na Região Médio de Minas Gerais, suspendeu atividades relacionadas ao livro “O menino marrom”, de Ziraldo, nas escolas da cidade, depois pressão de pais que consideraram o teor da obra “invasivo”.
O livro, de 1986, conta a história de dois amigos, um preto e um branco, que querem entender juntos as cores. Eles buscam saber o que é branco e o que é preto e se isso os torna diferentes. Para alguns pais, trechos do texto induzem crianças “a fazer malvadeza”.
Um dos trechos de “O Menino Marrom” citados por alguns pais em Mentor Lafaiete trata de um provável pacto de sangue entre os meninos, que não se conclui:
“‘Temos que fazer o pacto de sangue!’. Um deles foi até a cozinha buscar uma faca de ponta para furar os pulsos.”
Ele termina com os protagonistas optando por usar tinta no lugar de sangue:
“Ficaram os dois com as pontas do fura bolos cheias de tinta azul.”
O outro é um pensamento negativo que o protagonista tem em relação a uma velhinha que não aceitou a ajuda dele para cruzar a rua. Mas a ação também não acontece, por se tratar unicamente de um pensamento.
Em nota publicada nas redes sociais, a prefeitura disse que o livro de Ziraldo “é um recurso valioso na ensino, pois promove discussões importantes sobre reverência às diferenças e paridade” e “aborda de forma sensível e poética temas porquê inconstância racial, preconceito e amizade”.
No entanto, “diante das diversas manifestações e divergência de opiniões”, a Secretaria Municipal de Ensino solicitou a suspensão temporária dos trabalhos realizados sobre a obra, “a termo de melhor readequação da abordagem pedagógica, evitando assim interpretações equivocadas”.
“Lamentamos que tenham havido interpretações dúbias […]. A Secretaria, em sua função de gestão e fala entre escola e comunidade, compreende ser necessário momento de diálogo junto aos responsáveis para que não sejam estabelecidos pensamentos precipitados e depreciativos em relação às temáticas abordadas”, declarou a prefeitura.
Para o cartunista mineiro e profissional em literatura infantil José Carlos Aragão, a medida é uma “sintoma de exprobação a uma obra consagrada”.
“A literatura não pode ser tomada porquê um código de conduta, de moral e bons costumes. […] A literatura é arte, uma coisa que vai muito aliás. No sumo, um tema porquê esse pode ser tomado porquê um pretexto para um debate largo e urbano, que vai promover mais conhecimento”, afirmou.
A decisão do Executivo gerou reações entre pais de alunos e docentes da rede municipal de ensino.
Para a professora Marta Glória Barbosa, que dá aulas de português para o ensino médio, a medida é prejudicial para os estudantes.
“É preocupante. Sou professora de português, logo, qualquer retirada de livro, para mim, é o montão do contra-senso. O livro é espetacular, escrito pelo Ziraldo, que é nosso. Não vejo nenhuma justificativa para essa suspensão”, afirmou.