Para a esquerda trata-se de uma crise com inédito potencial de catástrofe

O ministério dos direitos humanos é o único ministério a se opor frontalmente à agenda da privatização dos presídios, que interessa ao setor privado e a uma sociedade que não se envergonha de ser racista. Temos 800 mil pessoas encarceradas, a vasta maioria composta por pessoas negras. A quem interessa o derretimento do único ministério que faz frente à privatização no momento decisivo?

Isso quer dizer que as denúncias não devem ser levadas a sério? Jamais. Isso quer dizer que precisamos ter a capacidade de enxergar a situação a partir de seus muitos ângulos e entender o momento em que denúncias – que pelo visto não são novas – foram vazadas.

Nesse momento temos então a obrigação de nos indagar a respeito de mais uma camada: E os demais ministérios comandados por pessoas brancas? Seriam eles um paraíso para mulheres?

Se esse caso servir para que o governo faça uma investigação profunda nas questões de gênero em seu interior então, sim, teremos ganhado alguma coisa. Mas se, nesse tempo, os presídios forem privatizados sem que um governo que se diz de esquerda tenha feito nada para impedir, teremos perdido bastante do outro lado.

Os movimentos negros terão que lidar com toda a complexidade da questão. As feministas terão que lidar com toda a complexidade da questão. E a esquerda não poderá fechar os olhos para o debate de gênero do qual foge como a formiga do tatu dessa vez sem esquecer que existem questões de raça, como a privatização dos presídios, que são centrais e estão coladas na pauta.

Se as denúncias não forem provadas, perde o feminismo. Se as denúncias forem provadas, perde a luta antirracista. Se o ministério dos direitos humanos derreter, perdemos todos. Se o ministério das mulheres derreter, perdem as mulheres. Desde já, perdemos os que nos identificamos com pautas de inclusão, de solidariedade e de justiça social.