Março 19, 2025
Parte do déficit das estatais federais é materialização de investimentos. Entenda

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AgênciaGOVRecentemente, a imprensa começou a falar de um déficit expressivo das empresas estatais. Esse dado, compilado pelo Banco Central e sobre o qual a imprensa está se dedicando, contudo, diz respeito não apenas às empresas estatais federais, mas também às empresas controladas por Estados e municípios.

Além disso, muitas reportagens confundem déficit e prejuízo e desconsideram que, na contabilidade empresarial, o déficit, olhado de forma isolada, não é o resultado mais relevante para a avaliação das companhias, pois ele leva em consideração apenas receita e despesa primária do mesmo ano corrente e ignora os recursos em caixa, disponíveis de receitas de anos anteriores.

Importância das estatais federais para a economia brasileira – Em 2023, o conjunto das 123 empresas estatais federais produziu uma riqueza de R$ 627,1 bilhões (Valor Adicionado Bruto), equivalente a 5,75% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, e registrou lucro de R$ 197,9 bilhões. A União controla diretamente 44 estatais federais e, de forma indireta, outras 79 empresas que são subsidiárias das empresas de controle direto. Juntas, essas 123 empresas empregavam 436.283 trabalhadoras e trabalhadores no ano passado.

A estatística fiscal do Banco Central referente às estatais federais considera apenas uma parte das estatais federais não dependentes de recursos do Tesouro. Empresas  lucrativas, como é o caso da Petrobras e dos bancos federais (Banco do Brasil, Caixa, BNDES, Banco do Nordeste e Banco da Amazônia) não entram na conta.

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Déficit é diferente de prejuízo – O resultado primário (superávit ou déficit) das empresas estatais federais não dependentes é calculado a partir da diferença entre suas receitas e suas despesas (incluindo investimentos) dentro de um determinado período. Ele não contabiliza os recursos que as empresas já traziam em seus caixas de períodos anteriores, nem eventuais receitas de financiamentos.   O resultado primário, nesse sentido, não é uma medida adequada de saúde financeira da companhia. É comum empresas registrarem déficit primário mesmo com aumento do lucro se estiverem acelerando seus investimentos, na expansão/modernização dos negócios.

Como exemplo, com base nos dados da Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (Sest), a Casa da Moeda do Brasil fechou o ano passado com déficit de R$ 125 milhões, mas registrou lucro líquido de R$ 202 milhões – valor quase nove vezes maior em relação ao lucro líquido de R$ 23,4 milhões de 2022. Já a Serpro, que teve déficit de cerca de R$ 107 milhões, obteve  lucro líquido de R$ R$ 450 milhões no mesmo ano.

Apenas estatais federais e sem impacto no fiscal – Nos dados apresentados mensalmente pelo Banco Central, no acumulado de janeiro a agosto, o déficit de todas as estatais alcançou R$ 7,21 bilhões, dos quais R$ 3,37 bilhões, menos da metade, diz respeito às empresas federais. E parte expressiva desse déficit corresponde a investimentos feitos pelas companhias.

No caso do governo federal, essas estatais não dependem de recursos do Tesouro para suas despesas de custeio (como pagamento de salários e conta de luz, por exemplo) e por isso elas não impactam o equilíbrio fiscal com o qual o governo está comprometido.  Em casos específicos, contudo, elas recebem aportes do Tesouro para desenvolver projetos de investimentos. Nos anos em que esses recursos saem do Tesouro Nacional e entram no caixa das companhias, eles são contabilizados como receita para as estatais.

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Como os projetos de investimentos são normalmente de longo prazo, nos anos seguintes, conforme essa receita de anos anteriores é utilizada, sua materialização pode gerar déficits sucessivos até sua conclusão. É como se um aporte volumoso em um ano “contratasse” déficits nos anos seguintes. Tudo de forma planejada e esperada.

Aportes geram superávit no curto prazo. E déficit nos anos seguintes – Em 2019, por exemplo, as estatais não dependentes que constam da estatística do Banco Central, receberam aportes de R$ 10,1 bilhões para realizar investimentos.  Naquele ano, o superávit primário das mesmas estatais foi de R$ 10,4 bilhões. Em contraposição, os déficits de 2023 e 2024 representam, em parte, o início da transformação daqueles aportes em investimentos.

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Um exemplo concreto é a Emgepron, que recebeu R$ 2,7 bilhões em 2018 e outros R$ 7,5 bilhões em 2019 para a construção de quatro fragatas da classe Tamandaré para a Marinha Brasileira. Naqueles anos, tais aportes do Tesouro ajudaram a compor os superávits das estatais federais. Agora, em 2024, a empresa já investiu R$ 1 bilhão no programa das fragatas até julho (segundo dados informados pela empresa no Sistema de Informações das Estatais – Siest), despesa que, por ser realizada com recurso obtido em anos anteriores, fica registrada na contabilidade do Banco Central  como déficit. Apenas esta operação explica, portanto, parte do déficit acumulado de R$ 3,37 bilhões do conjunto das estatais consideradas na estatística do BC.

Como podemos ver no gráfico abaixo (que utiliza os dados de acompanhamento das empresas estatais feita pela Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais do Ministério da Gestão e Inovação – Sest/MGI), considerando uma série histórica mais longa, há forte correlação entre os aportes do tesouro repassado às empresas estatais e o resultado primário dessas empresas.

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gráfico

No ano em que há o recebimento desses recursos, o resultado primário tende a melhorar substancialmente. No entanto, como os projetos de investimentos são normalmente de longo prazo, eles se distribuem ao longo dos anos subsequentes, gerando déficits sucessivos até a conclusão do projeto em questão.

Nesse contexto, diante do grande volume de aportes realizados durante o governo anterior, os resultados atuais são esperados e inclusive previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias, que fixou limite de déficit para as empresas que compõem este cálculo. Tais limites estão sendo acompanhados e vêm sendo cumpridos, com folga, tanto em 2023 quanto em 2024. Deve-se ressaltar, no entanto, que como parcela dos déficits representa aumento dos investimentos, no curto e longo prazo eles estimulam o crescimento econômico e geram receitas futuras, em muitos casos, suficientes para cobrir o investimento inicial.

Nota explicativa – Embora o MGI, por meio do acompanhamento da SEST, mantenha uma contabilidade das empresas estatais pelo critério acima da linha (receitas e despesas primárias), essa nota considerou os valores de resultado primário das estatais federais na estatística do Banco Central, que utiliza o critério abaixo da linha (variação do endividamento), porque esse é o cálculo oficial do resultado fiscal e é ele que tem sido utilizado pela imprensa.

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