Siso Incomum
1. O papel do Ministério Público no processo penal: além de titular da ação penal, é só um opinador?
Recentemente ingressamos, em nome da Anacrim, com ADPF para ver a enunciação de não recepção do item 385 do Código de Processo Penal. A inicial pode ser vista cá anexa à material do ConJur.
Logo veio uma polêmica. MP só opina, não requer, dizem alguns. Outros se assustam e dizem: o que vamos colocar no lugar? Quem controlará o MP? Ainda há os que se contentam com o que já vem sendo disposto, pavimentando cada vez mais a estrada do realismo jurídico, tão ao sabor da comunidade jurídica brasileira: o Recta é o que os tribunais dizem que é.
Os subscritores da ADPF somos mais otimistas. Somente pedimos o cumprimento da Constituição. Poderíamos ter pedido soluções alternativas uma vez que versão conforme ou apelo ao legislador. Preferimos, no entanto, de forma ortodoxa, apostar na jurisdição constitucional: se é inconstitucional, tem de tirar do ordenamento. E, convenhamos, não parece adequado à Constituição a permanência de um dispositivo que diz que o papel do MP é meramente de opinador do processo. Uma vez que integrante do MP por 29 anos, fico entediado quando se tenta rebaixar o papel do Ministério Público. MP é agente político do Estado. É uma magistratura. Tem as mesmas garantias. Logo, se o próprio STF já reconheceu que o sistema é acusatório, qual é o sentido de um dispositivo inquisitorial que vem das profundezas do Estado Novo da dezena de 40 do século pretérito? Eis um bom tema para seminários nas faculdades e cursos de pós.
2. E o juiz de Porto Satisfeito aplica a Constituição corretamente
Pois nesta poste quero mostrar que ninguém deve se assustar com a novidade. Que nem é tão novidade. A 5ª Câmara do TJ-RS, aos tempos de Amilton Bueno de Roble, quando eu era procurador de Justiça, já a praticava. Há duas décadas.
Em Porto Satisfeito, recentemente, o juiz Roberto Coutinho Borba proferiu uma decisão adequada à Constituição, ao considerar não recepcionado o item 385 do CPP. Em uma ação penal, o Ministério Público requereu a perdão do réu. Disse o promotor que da estudo do conjunto probatório não era provável concluir pela prática delitiva, razão pela qual requeria a perdão poderoso no item 386, inciso VII, do CPP.
Pedra
O juiz Roberto mostrou na sentença que a inércia do magistrado é a garantia da sua imparcialidade. E isso é zero mais zero menos que o sistema acusatório, já reconhecido pelo STF. A formulação de pedido de perdão implica evidente desistência da pretensão acusatória, diz o juiz Roberto, citando Paulo Rangel e Aury Lopes Jr, para quem a base indispensável do processo não é a lide ou o conflito de interesses, mas sim o manobra de uma pretensão (logo, se o censor deixar de exercê-la, o processo perde a sua sustentação).
Eis uma sentença protótipo de sistema acusatório. E vejam: o Ministério Público sai fortalecido. E a magistratura também. Por qual razão o juiz poderia reprovar se já não há pretensão acusatória?
É essa a pergunta que levamos na ADPF 1.022 para a Suprema Namoro responder.
Do mesmo modo, se Ministério Público é contra, juiz não pode preceituar preventiva em audiência de custódia, conforme já escrevi há alguns dias cá no ConJur.