Março 28, 2025
Futebol não é esporte, de Carlos Zanón

Futebol não é esporte, de Carlos Zanón

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O futebol pode ser considerado a volume fermentada dos demais esportes coletivos. Todos eles são variações do futebol praticadas por pessoas que não gostavam de futebol, não tinham capacidade física para jogar ou achavam rés. De todas essas propostas – façamos cestos, brinquemos com as mãos, na chuva ou com uma rede no meio – destilaram-se regras e formas de ser elegante, justo, urbano e risonho. Eles foram considerados esportes desde o primeiro minuto. Não é futebol.

Final da Copa del Rey entre Athletic Bilbao e RCD Mallorca

Final da Despensa del Rey entre Athletic Bilbao e RCD Mallorca

Reuters

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Era muito mais difícil pensar o futebol uma vez que esporte porque o futebol era uma guerra, uma vez que se matar sem morrer de verdade. O primitivo, a guerra de guerrilha ou por esmagamento, vale tudo, as bandeiras e os insultos, as armadilhas, o que foi dito, a guerra totalidade e corpo a corpo, a matilha de caçadores atirando na fera indefesa que, no Forma de goleira, ela defende os desesperados, com mãos e pés, só ela. A povaléu insultando e incentivando a realização do opositor, do juiz, do general ou dos próprios soldados que caíram em desgraça em terreiro pública. Cheira a linimento e napalm: cheira a futebol.

Já não nos matamos entre bairros, clãs, classes sociais e países pelo futebol. Esse é o seu valor

Já não nos matamos entre bairros, clãs, classes sociais e países pelo futebol. Esse é o seu valor. Nele temos sido rudes, cruéis, racistas, injustos, anjos e demônios, e graças ao hooliganismo inglês podemos vestir agasalhos caros uma vez que roupa para ir ao supermercado ou esperar o distribuidor mudança. Temos sido absurdos e veementes uma vez que numa guerra, quer a tenhamos perdido ou vencido, quer nos amotinamos contra Agamemnon ou pedimos o volta do Rei Artur. Oponentes que são inimigos, traidores e teimosos, assassinos que chegaram a matar só por vestir a camisa oposta. O futebol, além de quem o joga e faz dele a nossa poema e bálsamo, é essa fossa séptica. É daí que vem Rubiales, segurando as bolas com as duas mãos ao lado da Rainha, e as lágrimas de Vinícius – um grande jogador, um mau desportista, uma boa razão. Desse poço saem jogadores desconfiados pelo indumentária de saberem falar ou pensar muito e pela legalização de quem só sabe expor lugares-comuns, modalidade de reforço escolar urgente, ou sussurrar palavrões para se encorajar e se animar. Campeões mundiais até abrirem a boca.

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Nesses detritos vivem os ultras e os pais das festas infantis, os deputados, os diretores e os presidentes que são fofoqueiros, prostitutos, sempre preguiçosos e ladrões. Daí a Arábia Saudita, a conversa mostra que cheira a merda e cocaína, a Despensa do Mundo no Espiolhar e subornos. O futebol fingiu relutantemente ser um esporte. A única resgate provável num mundo em guerra real – Ucrânia, Gaza, Tráfico de Drogas – é o futebol ser resgatado pelos atletas e pelo Estado, e forçado a ser um desporto e encontraremos outras formas de sermos primitivos, vulgares, cafonas, barato e ofensivo. A merda sempre flutua. Não vamos nos preocupar com isso.

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