Boutiques de roupas, joalherias elegantes, livrarias aconchegantes e restaurantes coloridos percorrem a Rua Ledra, uma das principais artérias da cidade de Nicósia, Chipre. Nesta avenida simples e movimentada de edifícios ocres, tudo parece decorrer com aparente normalidade. Porém, num determinado ponto da rua, junto a uma loja de souvenirs e a um multibanco, existe alguma coisa extremamente inusitado: um posto fronteiriço para transpor para o outro lado da estrada.
Tal porquê aconteceu em Berlim há décadas, um muro divide Nicósia. A Risca Virente ou Risca verdejante Estende-se para além da cidade e, durante 160 quilómetros, atravessa a ilhéu mediterrânica de leste a oeste, separando a República Turca do Chipre do Setentrião, reconhecida exclusivamente pela Turquia, da República de Chipre, membro da União Europeia desde 2004—. Nicósia é uma capital fragmentada e a sua superfície pertence a dois países.
No território cipriota, subjugado por vários impérios e estados ao longo da história (gregos, romanos, bizantinos, venezianos, otomanos e britânicos), coexistem hoje diversas identidades nacionais, representadas principalmente por gregos e turcos. As tensões entre os cipriotas gregos e os cipriotas turcos começaram em 1960, quando Chipre conquistou a independência do Reino Uno. Estas tensões persistiram durante o processo de formação de um novo país e intensificaram-se gradualmente, culminando em 1974 com um golpe de estado liderado por nacionalistas pró-gregos. O seu objetivo era apender a ilhéu mediterrânica ao país helénico, logo imerso numa ditadura. Nesse mesmo ano, em resposta, Türkiye invadiu o setentrião da ilhéu, desencadeando um conflito armado. Embora o golpe de Estado tenha falhado e a democracia tenha sido restaurada, as forças militares turcas nunca se retiraram e muitos cipriotas gregos, na sua maioria de fé ortodoxa, foram forçados a deixar as suas propriedades e fugir para o sul. Desde logo, uma zona de segurança foi imposta na ilhéu.
Essa risco divisória também fragmentou Famagusta, a cidade costeira que até logo era um dos maiores destinos turísticos da Europa. Ali, nas praias cristalinas do luxuoso bairro de Varosha, estrelas de Hollywood porquê Brigitte Bardot, Paul Newman, Elizabeth Taylor e Richard Burton caminharam. Com o golpe de Estado, os ponteiros dos relógios de Varosha pararam e o tempo congelou num eterno final de agosto.
Os quase 40 milénio habitantes de Varosha deixaram as suas casas na esperança de tornar para lá quando a guerra terminasse. No entanto, em seguida os combates, a superfície permaneceu nas mãos da República do Setentrião de Chipre. Aqueles que fugiram não foram autorizados a tornar e tornaram-se refugiados dentro do seu próprio país. Uma dezena depois, uma solução da ONU impediu que o província de Varosha fosse repovoado com uma população turca.
Hoje os seus antigos hotéis de luxo, os seus restaurantes com vista para o mar e as suas praias de areia dourada são testemunhas mudas da dor e da passagem do tempo. Todos os complexos turísticos tornaram-se ruínas conquistadas pela natureza, as casas permanecem vazias e as praias paradisíacas estão rodeadas de arame farpado. Placas de superfície restrita alertam sobre passagem proibida.
Música, uma ponte em tempos pós-conflito
O conflito deixou marcas profundas na história e na cultura da ilhéu. Os sons de morteiros e balas deixaram ecos na música cipriota. A música fala de nostalgia, dor e perda Famagusta, composta pelo talentoso cantor Stelios Chiotis, que regressou ao Chipre depois de ter emigrado para Inglaterra em seguida a invasão turca. Essa música se tornou um hino que encapsula um sentimento de perda, mas também de esperança.
Se alguma coisa caracteriza a música cipriota, é a variedade de suas influências: escalas e melodias helênicas, instrumentação e ritmos otomanos, técnicas vocais bizantinas. As danças tradicionais também revelam as raízes ecléticas de Chipre. Ele xarope, onde os dançarinos se dão as mãos formando uma manante, vem da Grécia. Ele anticristouma dança para casais, é muito parecida com a dança Karsilamas disperso em Türkiye.
Desde os tempos históricos, a música tem desempenhado um papel fundamental porquê ponte cultural. Um exemplo simples disso é a proposta músico do aclamado artista de jazz Mehmet Ali Sanlıkol que, sendo de progénie cipriota turca, conseguiu fabricar uma relação genuína através do seu álbum Música de Chipre. Neste trabalho, Sanlıkol colabora com talentosos músicos cipriotas gregos e presta uma comovente homenagem às canções folclóricas de ambas as regiões divididas pela Risca Virente. A sua abordagem inovadora e a sua capacidade de unir duas comunidades cujas feridas ainda estão abertas são verdadeiramente eficazes e importantes.
O grupo Monsieur Domaine, de Nicósia, também mostra com força porquê a música pode ser um poderoso elemento conciliador. Seu estilo funde folk, jazz e rock progressivo e suas letras são vingativas e atuais. Antonis Antoniou, vocalista do grupo, com seu primeiro álbum solo intitulado Kkismettinretrata musicalmente a Nicósia moderna e combina influências turcas e gregas com um objetivo simples: reafirmar a unidade numa cidade dividida.
“Chipre é pequeno demais para ter dois cenários musicais separados”
A organização Home for Cooperation, localizada na zona tampão da ONU em Nicósia, desempenhou um papel fundamental na promoção do diálogo e da colaboração entre turcos e gregos em Chipre. As suas atividades e projetos baseiam-se no poder transformador da arte e da cultura porquê meio de fortalecer a sossego na ilhéu. Graças a eles, novos artistas cipriotas emergentes podem dar a saber a sua música e oferecer uma resposta às barreiras físicas e mentais que ainda hoje existem na ilhéu, porquê é o caso do álbum A hora está madura, no qual participou um coletivo de quarenta músicos de ambos os lados da fronteira e cuja mensagem fala de união e amizade. De conciliação com os músicos por trás deste trabalho esperançoso, Chipre é excessivo pequeno para ter dois cenários musicais separados.
Vozes porquê as do Coro Bicomunitário pela Sossego, liderado por Lena Melanidou no província cipriota heleno de Paphos, são um exemplo de unidade e esperança. Formados por cipriotas turcos e gregos que cantam juntos nas duas línguas oficiais, ensaiam todas as quartas-feiras no hotel Ledra Palace em Nicósia, na zona tampão das Nações Unidas. A maior secção dos membros viveu a guerra de 1974 e reuniu-se graças à iniciativa de uma associação de moradores de quem objetivo era inferir, de alguma forma, a sossego.
O início não foi fácil: não tendo espaço para ensaiar, tiveram que praticar na floresta, ao ar livre ou em cafés, onde não eram muito vistos pelos clientes que eram contra uma abordagem. Tiveram de se habituar à vigilância e intimidação de ambas as frentes e às visitas frequentes de espiões que tentavam manter o grupo sob controlo. Eles não desistiram. O coro apresenta canções tradicionais de Chipre há mais de 25 anos.
Através da música, partilham a visão de um país reunificado e em sossego. Todos os membros do coro vestem branco e é impossível enobrecer quem é cipriota heleno e quem é cipriota turco. A sua voz é a de todo Chipre.
Sol e praia: a verdadeira origem do ABBA
Publicado em setembro de 1970 porquê lado B do álbum Felicidade e com duração de pouco mais de três minutos, a música Ei, velho! É a primeira gravação em que podemos ouvir as vozes dos quatro integrantes do grupo ABBA juntos. Ainda faltariam mais dois anos para que o quarteto sueco fosse oficialmente criado.
A teoria da colaboração entre Agnetha Fältskog, Björn Ulvaeus, Benny Andersson e Anni-Frid Lyngstad surgiu alguns meses antes, graças a um pacote de férias oferecido pela sucursal de viagens sueca Fritidsresor para promover o turismo nas praias do Mediterrâneo. Em Abril, os quatro músicos partiram para Chipre. Uma vez lá, eles desfrutaram de onze dias de sol e areia com todas as despesas pagas na Twiga Tower, um conjunto superior e estreito de apartamentos de férias. Em troca, bastaram posar durante uma sessão de fotos e oferecer um concerto aos soldados da ONU que estavam estacionados na ilhéu. A essa profundidade, todos eles haviam iniciado suas carreiras porquê músicos solo.
A noite músico com que encantaram um público uniformizado durou exclusivamente trinta minutos; Eles tocaram diversas músicas em sueco e, segundo o público, não foi um show realmente memorável. Mesmo assim, nascente foi o germe da curso músico do grupo; o ponto zero que antecedeu o espetáculo que apresentariam mais tarde em Gotemburgo, denominado Pessoas festeiras. Logo começaram a sentir o paladar do sucesso, mas tinham que resolver uma questão: precisavam de um nome adequado para o grupo. Seu produtor e empresário, Stig Anderson, decidiu resolver o problema e propôs o ABBA, uma {sigla} (e palíndromo) formada pelas primeiras letras de seus nomes. Anderson não percebeu na era que o nome também era de uma empresa de conservas de peixe bastante conhecida na Suécia. Felizmente, a empresa conserveira não se opôs a que a margem usasse o mesmo nome, desde que o grupo concordasse em não desenvolver uma atividade que envolvesse concorrência direta.
Em 1974, Waterloo, cantiga inspirada na famosa guerra, cuja letra narrava uma rota amorosa, triunfou no Festival Eurovisão da Música e o grupo sueco conquistou o mundo. O fenômeno ABBA foi desencadeado. Nesse mesmo ano, Varosha, cidade onde nasceram, tornar-se-ia uma cidade fantasma.