Março 24, 2025
Trova de Giuseppe Ungaretti para seu irmão Costantino

Trova de Giuseppe Ungaretti para seu irmão Costantino

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Esse trova De Ungaretti abre com uma imagem muito possante: “Não poderei mais me olvidar chorando”, um verso pleno de significado que contém, por conformidade, a quesito despreocupada da puerícia. A puerícia torna-se um ponto sem volta, a laceração irreparável entre a puerícia e a idade adulta se dá pela vivência da dor.

O responsável vincula efetivamente o ser petiz ao prazer de distrair, decorrer e se movimentar: nisso “me esqueça em um pranto”contém uma sequência significativa de acontecimentos, a petiz brincando, a petiz correndo a uma velocidade vertiginosa e num grito cima e ressaltado, ela esquece toda dor, todo ressentimento. Na puerícia tudo passa, tudo é esquecido, nenhum remorso é definitivo. O ataque da letra de Ungaretti – que pode ser condensado na imagem estática de uma petiz perseguindo uma pipa, uma síntese extrema de leveza e rapidez – nos dá um retrato impiedosamente verdadeiro da puerícia.

Em Eu perdi tudo Giuseppe Ungaretti expressa a dor pela morte de seu querido irmão Costantino, mas não só isso, na angústia de Ungaretti há também o luto pela perda de seu fruto Antonietto, falecido com unicamente nove anos, em 1939, devido a um apêndice ruim curado.

E nunca mais poderei

Esqueça-me em um grito.

A memória do fruto também se torna palpável em outro poema presente na coleção, Dor (1947), intitulado Dia a dia em que há um grito semelhante de possante poder significativo:

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E eu te senhoril, eu te senhoril e é um embate contínuo!”.

Isto pode ser lido porquê a prolongação do grito húngaro anunciado em Eu perdi tudoque abre a coleção Dor. É um grito mudo, estrangulado, muito dissemelhante daquele ainda vital de raiva, vingança, rafa de vida presente em O porto enterrado. O que ouvimos agora é o grito de um varão que se perdeu e não tem mais palavras para narrar a tragédia da sua vida.

Logo, Tudo está perdidoporquê sugere o título do poema: la vocábulo nua por Ungaretti aparece reduzida à sua forma material primordial, tal porquê a pedra do Monte San Michele, em Gorizia, que fossilizou as suas lágrimas em Eu sou uma indivíduo. O poema termina com uma imagem semelhante referindo-se a um “rocha de gritos”que parece estar recluso no fundo da gorgomilos, estrangulando a voz. A incomunicabilidade da dor é uma permanente na trova húngara. Mas a verdadeira pedra em Tudo está perdido não é a vocábulo, mas o coração do poeta, escavado pelo sofrimento porquê uma rocha cárstica.

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Vamos desvendar texto, análises E Comente.

“Tudo que perdi” de Giuseppe Ungaretti: texto

Eu perdi tudo da minha puerícia

E nunca mais poderei

Esqueça-me em um pranto.

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Enterrei minha puerícia

Nas profundezas das noites

E agora, punhal invisível,

Isso me separa de tudo.

Lembro que me alegrei em amar você,

E cá estou eu perdido

Em noites intermináveis.

Desespero que aumenta incessantemente

A vida não é mais minha,

Parou no fundo da gorgomilos,

Que pedra de gritos.

“Tudo que perdi” de Giuseppe Ungaretti: estudo e observação

Sobre esta letra o próprio Ungaretti escreveu: “É a letra que abre a dor e é o seu portada”. Num único poema, com um título significativo Eu perdi tudoo responsável condensou duas mortes que o afetaram profundamente: a morte do irmão e o drama do desaparecimento do segundo fruto.

Um é um luto recente (Antonietto morreu em 1939, Constantino em 1937), o outro nem tanto, mas ambos são feridas do coração que não cicatrizam: é porquê se as duas mortes dialogassem na psique do poeta, despertando em lhe um sentimento semelhante – e intransponível – de perda.

A morte do irmão Costantino marca para Ungaretti a separação definitiva da puerícia: nunca mais será aquela petiz que corria esquecida de si mesma, porquê indica a primeira imagem do poema que parece sublimar a inocência da puerícia através de uma conformidade.

A dor assume a ar metafórica de um “punhal invisível”que se coloca entre o poeta e a verdade, distanciando-o de tudo e fazendo-o perceber-se porquê estranho à concretude da verdade. Metáfora perfeita para o luto. A memória do irmão pertence a outro lugar, a outro tempo, à certeza de uma alegria perdida:

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Lembro-me de que me alegrei em amar você.

A verdade desta revelação, esclarecedora e repentina, contrasta com a negrume da noite do esquecimento em que o poeta afundou porquê num abisso. A negrume que se expande infinitamente é outra metáfora tangível da dor do luto que agora o envolve sem evasão. A perplexidade é inevitável nesta negrume em que é impossível orientar-se. Depois de nos dar a percepção da dor através do esfera visualUngaretti retorna com uma sinestesia para esfera auditiva e ao veículo de informação por superioridade, nomeadamente a voz. Afasiaa impossibilidade de manifestar, é chave fundamental para a compreensão do texto que se condensa numa imagem tão evocativa quanto a de lisura: “pedra dos gritos”. Indica a impossibilidade de manifestar, a incapacidade de expressar uma dor que é, por definição, indizível.

A vocábulo que se transforma em pedra é uma conformidade recorrente na trova de Ungaretti e é também uma pura sentença da poética de Ungaretti que faz sua própria “vocábulo nua”reduz o léxico e a sintaxe aos termos mínimos, eliminando adjetivos, advérbios, pontuação, realçando o substantivo único em seu valor puro e nu, a ponto de tornar seu significado abrangente.

Você não pode falar sobre dor; porém em Tudo está perdido Ungaretti consegue nos fazer percebê-lo, dando-lhe o som de um grito estrangulado na gorgomilos, de uma vontade reprimida de manifestar que se transforma em pedra, torna-se estéril e material, porquê um “lágrimas que não podem ser vistas” e permanece ali, imóvel, perdido, equilibrado entre a gorgomilos e a voz.

Todo o poema gira em torno da imagem efetiva do grito que se torna sentença vocal e humana da dor. Só às crianças, assinala o poeta, é facultado o privilégio do esquecimento do mal, do esquecimento da dor e, talvez, também da panacéia salvadora da trato.

Fonte

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