Eram 19 horas de sexta-feira, 21 de junho, quando Patrícia Mata, três amigas e a namorada chegaram à porta do Rock in Rio Lisboa. Passaram lá a noite toda com um único propósito: estarem na fileira da frente para o concerto de Carolina Deslandes no Palco Mundo, que decorreu levante sábado. O esforço foi recompensado, visto que a Galp ofereceu-lhes uma ingresso para o golden circle, dimensão à qual poucos têm chegada.
Para se protegerem do insensível, puseram uma toalha de praia no pavimento e taparam-se com mantas que também colocaram em cadeiras para criarem um abrigo improvisado. Quando outros festivaleiros começaram a manar, perguntaram-lhes quem estavam lá para ver. Respondiam que era Carolina Deslandes e passavam imediatamente a ser olhadas com desdém. Farta, Patrícia viu-se forçada a tomar uma posição.
“Não podemos acampar só pelos artistas internacionais. Os nossos também são bons e temos de lhes dar valor porque eles merecem”, conta à NiT. “Ela é a primeira portuguesa da pop a pisar sozinha o Palco Mundo do Rock in Rio Lisboa ao termo de tantos anos.”
A primeira vez que assistiu a um espetáculo da cantora foi em 2019, numa performance gratuita que Deslandes deu no Almada Fórum, cidade de onde é originário — embora atualmente viva em Lisboa. Patrícia estava mesmo adiante do palco e ficou encantada. “Esta mulher tem muito para dar”, pensou. “Preciso de ver isto mais vezes”.
Durante os três anos seguintes, ou seja, até 2022, acompanhou-a à intervalo, visto que nem ela, nem a mãe tinham possibilidades monetárias para ir aos seus espetáculos. Isso mudou em 2023, quando começou a trabalhar porquê governanta em Lisboa — toma conta de um recém-nascido e da vivenda da família.
Do ano pretérito até agora, já foi a respeito de 17 concertos da artista e perdeu a conta de quanto quantia gastou, mas sabe que foi “muito”, até porque tem de tratar do alojamento, comida e viagens. “Se ela completar o concerto à meia-noite, às vezes apanhamos o autocarro ou comboio à uma ou duas da manhã.”
Garante que todas as experiências são diferentes, apesar de muitas vezes os shows estarem enquadrados na mesma passeata pátrio. “A força do público muda tudo”, reforça.
Já a viu no Porto, em Braga, Lisboa, Algarve, entre outros. Em agosto, também vai a Fortaleza Branco e em dezembro estará em Viana do Fortaleza. “Tudo para invadir o coração da Carol”, comenta.
Patrícia confessa ainda que quando era mais novidade costumava ser uma pessoa bastante solitária. Na escola sofria de bullying por razão da roupa que usava, “que não era a da tendência”, e por ser mais enxurrada. Era generalidade fechar-se nas casas de banho e induzir o vómito para não engordar. O distúrbio já não a afeta tanto, mas a relação com o seu corpo continua a ser um tópico difícil para si.
“É um pouco que não se ultrapassa porque fica para sempre connosco. Quando vou a qualquer sítio e vejo todas as minhas amigas magras e eu sou a única fora do padrão, sinto-me mal. Elas tentam animar-me, mas eu não me olho com os olhos dela.”
Esta é um tema que Carolina Deslandes aborda frequentemente nas suas canções. Patrícia, de 25 anos, gostava que o seu ídolo se pudesse ver da forma porquê ela a vê, ou seja, “perfeita”. No entanto, levante é um parecer que ela própria não consegue seguir.
Há muitos outros temas importantes sobre os quais Carolina Deslandes fala na sua discografia, porquê o espetro do autismo, violência, liberdade e corpo da mulher.
“São assuntos importantes e que merecem mais visibilidade. Toda a gente dá atenção a temas porquê os namoros que ela teve e sobre o corpo dela. Não é isso que destaca uma artista. Infelizmente, ainda vivemos numa sociedade muito machista. Juntamente com a Carolina, vamos lutar para que isto mude”, assegura.
O traumatismo de desistência é o matéria com o qual mais se identifica. Tal porquê Carolina, também Patrícia sentiu muito a falta do pai ao crescer. “Ele era muito ausente e trabalhava de noite. Quando chegava a vivenda, eu já estava a dormir. Nunca tive a paternidade de que precisei. Sempre foi a minha mãe, eu e a minha mana.” Com o passar dos anos, reaproximou-se do progenitor, que atualmente já voltou a fazer segmento da sua vida.
Antes solitária, agora tem várias amigas que nasceram do paixão partilhado pela artista. Conheceu-as em concertos e em páginas de clubes de fãs nas redes sociais. Já Margarida (ou Magui), a sua namorada, apareceu na sua vida por razão do fã clube de outra cantora, Áurea, e manteve-se graças a Carolina Deslandes.
“Íamos a muitos concertos da Carolina. Víamo-nos, mas nunca nos falávamos. Um dia, ela mandou-me mensagem no Instagram e começámos a falar e a coisa despertou-se. Ela é do setentrião, mas veio morar para ao pé de mim.” Mesmo quando não viviam perto uma da outra, arranjavam maneira de irem juntas aos espetáculos pelo País. “Ela uniu-nos muito”, revela.
Para levante espetáculo, o grupo organizou uma iniciativa peculiar: criaram tapume de 250 cartazes onde se lia “Não foi por um triz que tu conseguiste. #CarolNoPalcoMundo.” Sabe que são poucos papéis, mas é o suficiente para encherem a segmento da frente, que é o que a cantora consegue ver mais facilmente. “Carolina, tens de deixar de ser míope”, brinca. Patrícia, as amigas e a namorada também vieram com bandanas na cabeça, um secundário que a música usa frequentemente.
O carinho e paixão que sente pela cantora já fizeram com que se tornasse quase uma amiga da autora portuguesa. Na verdade, Carolina segue Patrícia no Instagram e tem um vídeo viral no TikTok com a artista. “Dei-lhe um jarro de tremoços e disse tremoços para a vida toda, porque ela adora levante snack.”
Também já esteve com ela várias vezes em seguida os espetáculos. Os seguranças e equipa conhecem-na e é generalidade irem ter com ela e com as amigas para os bastidores dos espetáculos. “Se estiver a chover e nós estivermos na fileira, eles são capazes de nos levar para o palco para estarmos abrigadas. São incríveis”, descreve.
Apesar de serem próximas, nunca ultrapassam os limites. “Se o pessoal dela nos disser que não dá mesmo para estarmos juntas, nós aceitamos porque sabemos que ela é uma pessoa e que a vida dela também pode ser bastante caótica.”
Patrícia sabe que não será provável estar com ela em seguida o concerto no Rock in Rio, mas se essa oportunidade surgisse, sabe muito o que lhe diria: “Obrigada por tudo o que tu ensinas, por nunca calares a tua voz e por mostrares ao mundo que todas podemos ser bonitas e perfeitas, tenhamos o corpo ou a roupa que tivermos.”