Atleta não mudou de sexo para disputar boxe feminino nas Olimpíadas #ÚltimasNotícias #Portugal

Posts enganosos afirmam que argelina Imane Khelif mudou de sexo para disputar boxe olímpico;

Khelif já foi desclassificada em torneio por não ser considerada elegível, mas cumpriu os requisitos do COI e está inscrita nos jogos como mulher;

Alegação de mudança de sexo passou a circular após luta contra atleta italiana que desistiu do combate ao levar um golpe.

A boxeadora argelina Imane Khelif não “mudou de sexo” para disputar as Olimpíadas de Paris na categoria feminina, como afirmam publicações enganosas nas redes. Khelif já foi desclassificada em um torneio mundial por critérios de elegibilidade, mas cumpriu os requisitos da Olimpíada, está inscrita como mulher e não se identifica como transsexual.

Publicações com o conteúdo enganoso acumulavam ao menos 400 mil visualizações no X. Circulam também Telegram e no WhatsApp, plataforma na qual não é possível estimar o alcance dos conteúdos (fale com a Fátima).

Colocar alguém [boxeadora argelina Imane Khelif] que mudou de sexo para competir no boxe olímpico com uma mulher não é fair game

Posts nas redes afirmam, sem provas, que a boxeadora argelina Imane Khelif mudou de sexo para competir nas Olimpíadas. A alegação ocorreu após uma luta em que Khelif competiu com a atleta italiana Angela Carini, que desistiu do embate aos 46 segundos. Carini explicou que não abandonou a luta por um boicote contra a rival, e sim após receber dois golpes e não conseguir respirar.

Khelif, que é embaixadora do Unicef na Argélia, participa de campeonatos mundiais de boxe feminino desde 2018 e, em nenhum momento, se identificou como transsexual.

Nesta quinta-feira (1º), o COI (Comitê Olímpico Internacional) informou que a idade e o gênero dos atletas participantes da competição são baseados em seus passaportes e que todos estão dentro das condições de elegibilidade para as competições em que estão inscritos.

Segundo o site do COI, Khelif e uma outra boxeadora têm sido vítimas de ataques após uma “decisão arbitrária” da IBA (Associação Internacional de Boxe), tomada sem procedimento adequado nem evidência científica, o que contraria o senso de boa governança.

Em março de 2023, a IBA desclassificou Khelif após a atleta ter ganhado medalha de ouro sob alegação de que ela não teria passado pelos critérios de elegibilidade.

Na época, a IBA não revelou o motivo específico da desclassificação. Em entrevista à TASSo presidente da IBA, Umar Kremlev, afirmou, sem citar nomes, que a associação identificou atletas que “fingiam ser mulheres” a partir de exames de DNA, que apontaram a presença dos cromossomos XY, mas os resultados nunca foram divulgados.

O Comitê Olímpico da Argélia disse que a atleta foi desclassificada por questões médicas. Já a imprensa argelina informou que altos níveis de testosterona, o principal hormônio masculino, teriam sido encontrados no sangue de Khelif, o que foi negado pela IBA.

Três meses depois, o COI excluiu a IBA dos Jogos Olímpicos por falhas recorrentes em integridade e transparência na governança, e a associação foi acusada de manipulação de resultados e corrupção. O boxe, porém, foi mantido para os Jogos Olímpicos de Paris e os de Los Angeles, em 2028.

Altos níveis de testosterona em mulheres podem ser causados por diversos fatores e a suposta presença dos cromossomos XY não prova que Khelif “mudou de sexo”.

• Altos níveis de testosterona em mulheres podem ocorrer, por exemplo, em razão do seu uso na forma de anabolizante para o aumento de massa muscular.
• Já a presença em mulheres de cromossomos XY — combinação predominante em homens — pode ocorrer devido a uma mutação do cromossomo Y. Neste caso apresentam as mulheres apresentam DDS (Diferença de Desenvolvimento Sexual);

DDS é um grupo de condições raras envolvendo genes, hormônios e órgãos reprodutivos. Algumas pessoas com DDS crescem como mulheres, mas têm cromossomos XY e níveis de testosterona no sangue equivalentes aos masculinos.

Desde as Olimpíadas de Tóquio, em 2021, o COI permite a participação de atletas com DDS. Segundo as últimas diretrizes do comitê, as atletas nessas condições só devem ser excluídas da competição feminina se houver problemas claros de equidade ou segurança.

Imane Khelif competiu nas Olimpíadas de Tóquio, mas perdeu para a boxeadora irlandesa Kellie Harrington nas quartas de final.

Políticos

As alegações enganosas sobre o gênero de Khelif foram republicadas por políticos brasileiros, como o senador Sergio Moro (União Brasil-PR), e os deputados federais Bia Kicis (PL-DF) e Capitão Alden (PL-BA), que se referiram à atleta como “trans”, o que é falso.

Em seu perfil no X, Moro criticou a luta de Khelif e disse que a atleta mudou de sexo, o que é falso. Em publicação posterior, Moro disse ter recebido informações de que a atleta não mudou de sexo e falhou perante a IBA. O senador, no entanto, omitiu o posicionamento do COI e a exclusão da associação de boxe pelo COI por falhas administrativas.

Aos Fatos tentou contato com os políticos citados, mas não houve resposta até a publicação desta checagem.

O caminho da checagem:

Aos Fatos verificou informações divulgadas pela IBA, pelo COI e pelo Comitê Olímpico Argelino e constatou que não há elementos que sustentem a alegação de que a boxeadora Imane Khelif ‘mudou de sexo’ para competir nas Olimpíadas.

Ainda que tivessem sido detectados altos níveis de testosterona no sangue e a presença dos cromossomos XY no DNA da atleta, como já foi aventado em 2023, ambas as condições não significam que a competidora “mudou de sexo”.