Maio 9, 2025
crónica de uma noite televisiva, ou uma vez que montar uma petardo atómica – Observador

crónica de uma noite televisiva, ou uma vez que montar uma petardo atómica – Observador

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De repente, fugir para a RTP2 para ver a 96.ª protocolo de entrega dos Óscares parecia oferecer o conforto de um sentido: festejar o melhor de um ano de cinema no único conduto de televisão que privilegia as artes na sua programação. E, no entanto, sabíamos que isso exclusivamente denunciava que, naquela noite, o filme era outro: as televisões generalistas estariam equipadas com especificações na noite eleitoral. E nem do Benfica, o mais crónico Best-seller português, se falaria por aí, mesmo que eu tivesse planejado fazer o que, até há muito pouco tempo, roçava a heresia: jogar em dia de eleições.

Era o quarto ano de Jimmy Kimmel na apresentação e também o quarto de volta da transmissão à RTP, o que por sua vez significa, digam comigo: Mário Augusto. Ora, Mário, que, desta vez contornou com um convidado único, o crítico César Nóbrega, posto naquele cenário modesto que não destoaria na televisão dos anos 80 (não é um insulto, sentimentalões dados à saudade nos confessamos), ainda contribuiua mais para o contraste com a lógica paradoxal de espetáculo das “noites eleitorais” nas generalistas: cheios de cor, convidados, estúdios virtuais e grafismos.

E, ainda que ninguém no Dolby Theatre tivesse uma vez que saber ou sequer interesse, tudo o que se depois passou do lado de lá do mundo, em alguma parte na ensolarada Califórnia, parecia desempenado com a mesma vontade estética: encontrar no cinema um refúgio de normalidade, num tempo e numa noite em pessoal em que a verdade vai se tornando um lugar cada vez mais estranho.

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Depois de, quase todos os anos, tentar passar por jovem, irreverente, “relevante”, uma vez que agora se diz, a lutar desesperadamente contra a perda de audiências e reinventar a roda a cada edição, a Liceu aceita, em 2024, ser simplesmente quem é: uma indústria do cinema e não um concorrente do TikTiok. Sem truques, sem truques, sem malabarismos. Uma protocolo sóbria, escorreita, em que nem o vídeo foi quase usado; assente no poder da vocábulo, do rosto, da música, do humor e da política exclusivamente e só quando ela se impõe. Sem estes nem trocas de envelopes, felizmente, sem preço a vontade de ser “diversa” à qualidade intrínseca de obras e artistas. Uns Óscares justos, num ano de cinema justo.

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Oppenheimer deu 7-1 a Barbie, o que talvez sejam prêmios a mais para o primeiro, mas não de menos para o segundo. Ó genial Pobres Criaturas levou quatro e o muro no estômago A Zona de Interesse dois, um a distinguir-lo uma vez que melhor filme internacional e o outro o seu inesperado trabalho de som (“Obrigado por ouvirem o nosso filme”, disse um dos premiados. Não poderia ter sido mais notório). De resto, ninguém levou mais de uma estatueta: Anatomia de uma Queda, Os Excluídos, Ficção Americana, O Rapaz e a Garça, a não deixar passar em simples grandes argumentos, grandes atores e Hayao Miyazaki, que é sempre grande. Faltou qualquer coisa para Dias Perfeitos e Vidas Passadasmas, uma vez que sempre se diz, sendo nomeados já contava uma vez que prêmio.

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Porque vemos os Óscares?, perguntava-se numa peça recorrente que ia passando nos intervalos. Pelo oração comovido e comovente de Da’Vine Joy Randolph, agradecendo a quem nos aparece no caminho para nos levar na direção certa, aquela que talvez nunca tivéssemos desvelado sozinhos. Por Robert Downey Jr. agradeça, enfim, o primeiro Óscar à sua “puerícia terrível e à ateneu… por esta ordem”. À sala em peso a desejar bom dia da mãe a Yoko Ono, a pedido do fruto Sean Ono Lennon, a propósito da vitória da curta de animação: A guerra acabou. Ryan Gosling transforma uma cerimônia de fumar e vestidos longos num concerto rock com a performance de Eu sou exclusivamente Ken – e a surpresa de Slash. Emma Stone agradece ao Óscar pela Bella Baxter que deu ao mundo e nunca esqueceremos e a travar-se de emoções com o vestido que estragou “certamente durante o Eu sou exclusivamente Ken!”

A emocionantedíssima Sandra Hüller que não venceu, mas foi talvez a segunda e terceira melhores atrizes do ano (em Anatomia de uma Queda e A Zona de Interesse). Justine Triet agradecendo ao Óscar de melhor argumento original por Anatomia de uma Queda, esperando que um “ajude a mourejar com a crise de meia-idade”. Cord Jefferson, segurando uma outra estatueta para o argumento, leste pelo adequado em Ficção Americanapedindo que, em vez de filmes de 200 milhões de dólares, se faça 20 de 10 e agradecendo a quem confiou num “preto quarentão que nunca tinha feito zero”.

Jonathan Glazer trazendo a guerra em Gaza para a discussão e a urgência de resistirmos à desumanização, e Mstyslav Chernov, realizador de 20 Dias em Mariupol, vencedor do Óscar para melhor documentário e “único realizador em palco que preferia nunca ter feito o seu filme”, a guerra da Ucrânia: “Não posso mudar a história, o pretérito. Mas todos juntos – estão cá algumas das pessoas mais talentosas do mundo – podemos prometer que a verdade prevalecerá. E que as pessoas de Mariupol nunca serão esquecidas. O cinema forma memórias, e as memórias formam a história.”

Mais primeiro, abrindo o Em memóriaa gravação de Alexei Navalny noutro documentário vencedor de um Óscar ainda muito recente, retomaria leste tema e leste deveria ser partilhado.

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Mais memórias que ficarão: o delicioso reencontro de Arnold Schwarzenegger e Danny DeVito no palco e com Batman, aliás, Michael Keaton, na placa: “You’ve got a nervura…” O amplexo de Spielberg e Nolan uma vez que quem passa um testemunho – a dura responsabilidade de tentar dar a ver em cada filme um pouco que um mundo que acha que já sabe tudo nunca viu. A cantiga de Billie Eilish que valeu um segundo e merecido Óscar aos 22 anos de vida. A glorificação de Emma Thomas, “produtora de todos os nossos filmes e de todos os nossos filhos”, uma vez que muito mais do que a senhora Nolan.

E porque, leste ano, a protocolo começou uma boa hora mais cedo, eram umas não muito impróprias duas e 25 da manhã quando tudo acabou e voltamos, brevemente, ao estúdio da RTP2. Nos outros canais, ainda se fez contas à menos clarificadora noite eleitoral dos últimos quase 40 anos de democracia no país. Mas, uma vez que do outro lado disse logo a fechar Mário Augusto, “o shô deve ir um”.

Continuamos, pois.

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