Março 20, 2025
Do jejum intermitente às receitas mágicas dos detox, passando pelos superalimentos ou pela privação de hidratos de carbono, há muitas ideias nocivas que circulam na extensão da nutrição

Do jejum intermitente às receitas mágicas dos detox, passando pelos superalimentos ou pela privação de hidratos de carbono, há muitas ideias nocivas que circulam na extensão da nutrição

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Apesar de já ter publicado diversos artigos científicos na sua extensão de investigação, a bioquímica nutricional, e de ser presença assídua na notícia social para incrementar a literacia, aos 50 anos Conceição Rebo nunca havia escrito um livro. Fê-lo agora, deu-lhe o provocatório título Deixemo-nos de Tretas (Contraponto, 208 págs., €17,70) e é uma vez que que um sopapo na mesa, provocado por duas décadas de clínica a ouvir as mais equivocadas certezas sobre sustento (um mês depois, já vai na segunda edição). Cansada dos mitos espalhados pelas redes sociais e da desinformação que grassa neste meio, a perito, uma das mais conceituadas em Portugal no seu métier, desconstrói algumas ideias feitas – deixe-se já cá escrito que a melhor forma de se consumir peixe, aproveitando todas as suas propriedades, não é cozido nem grelhado, mas sim em caldeirada. Chuva na boca? Há muito mais para ler nas linhas que se seguem, mantendo a Dieta Mediterrânica sob olho e a inflamação longe da vista.

Os hábitos alimentares acabam de ultrapassar o tabaco no ranking dos fatores de risco da mortalidade. É mais uma motivação para redigir um livro a pôr os pontos nos is?
Na veras, contextualiza muito a motivação inicial para redigir. A evolução da Medicina, com os antibióticos e as vacinas, deu-nos mais anos para viver, mas depois enchemo-los de doenças crónicas e temos falta de qualidade de vida. O facto é que a sustento potencia a saúde e que os hábitos desadequados estão associados à doença.

E à morte, uma vez que indiciam estes dados recentes divulgados pela Direção-Universal da Saúde, com base num estudo do Golden Burden of Disease.
É uma boa oportunidade para falarmos do objecto, pois temos a sociedade mais desperta para o tema e as pessoas a procurarem informação sobre sustento e saúde.

Só que há um problema com as fontes às quais se vai buscar essa informação…
As redes sociais proliferam muita informação e há bastante gente que não é da extensão da nutrição nem do jornalismo com imensa influência.

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Dê-me exemplos de ideias que circulam e que podem ser nocivas.
Saltar o pequeno-almoço incessantemente, com a questão do jejum intermitente, as receitas mágicas dos detox, os superalimentos – que até podiam ter alguma coisa boa por detrás, mas que passam a ser a panaceia para todos os males –, a privação de hidratos de carbono não indo além dos 20, 30 gramas por dia, e toda a panóplia de dietas mirabolantes.

Quando se estabelece esta relação da sustento com a mortalidade, não estamos só a falar de obesidade, pois não?
Evidente que a obesidade é a doença que se manifesta de forma mais visível. Mas os hábitos alimentares desadequados têm uma relação com o cancro, por exemplo, e isso pode não ter uma revelação clara. Ainda ontem estava a rever os números: um em cada cinco homens e uma em cada seis mulheres vai ter um cancro na vida, e 40% deles são evitáveis, porque estão muito relacionados com o estilo de vida.

Não se trata unicamente de sustento…
O estilo de vida são os hábitos alimentares, o sono, a atividade física, a gestão de stresse. Estas são as principais variáveis a que temos de prestar mais atenção e não é só quando já se tem a doença, nem só no envelhecimento, é para uma maior longevidade.

Enfim, o que buscam as pessoas que se perdem nas redes sociais?
Muitas vezes, já existe uma má relação com a sustento, porque têm problemas até de outras ordens, uma vez que a questão da soma, e acabam por ter uma penúria emocional, querem encontrar uma solução: continuar a consumir, mas não engordar, ou até, no limite, continuar a consumir o mesmo e perder peso. Isso não existe!

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É mais ou menos mal muita gente encara o Ozempic.
Trata-se de um remédio que tem algumas vantagens de açodar o processo, mas as pessoas têm de mudar o seu estilo de vida. Não faz sentido, seja para a perda de peso seja para o colesterol proeminente ou a resistência à insulina, no caso da diabetes, termos uma terapia farmacológica sem uma terapia nutricional uma vez que adjuvante.

Nunca houve tanta disponibilidade de informação e tanta gente tão mal informada. Combate-se isto com livros uma vez que o seu?
Mesmo na eventualidade de os nutricionistas terem redes sociais para irem repondo a verdade, isso não seria suficiente – é humanamente impossível, porque a velocidade e o número ou volume de informação é paradoxal.

Tem de ser frustrante…
Com o livro, o que tento é dar ferramentas para as pessoas se tornarem críticas e ter um filtro relativamente à informação. É um alerta para perceberem quem são de facto as fontes credíveis e onde devem procurar a informação. Sabemos que, por exemplo, a Direção-Universal de Saúde tem um programa de promoção da sustento saudável e produz muita informação, muitos manuais. Só que não tem qualquer tipo de alcance, não tem sequer um alcance parecido com qualquer influencer. As pessoas não conseguem ter critério, perceber de onde vem essa informação e depois, se calhar, as mais credíveis são aquelas a que acedem menos.

Nascente livro chegará aos públicos que se intoxicam nas redes sociais?
A verdade é que o livro, em menos de um mês, chegou à segunda edição, o que significa que também há muito quem procure leste tipo de informação credível. Foi uma surpresa – enquanto autora completamente desconhecida, sem redes sociais, não estava minimamente a narrar que tanta gente tivesse vontade de ler o livro e que passasse a vocábulo.

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Esta é uma extensão em que as pessoas tendem a posicionar-se em extremos?
É de facto muito mais fácil adotarem atitudes extremas. Uma delas é “o proveniente faz muito”. Quando falamos dos ultrapassados ou muito processados, aparece o outro extremo do tudo rendeiro, tudo proveniente. Dou sempre leste exemplo: o cianeto também é proveniente e mata. O facto de ser rendeiro não tem necessariamente de ser melhor, porque se fizer uma sustento enxurro de sal, gordura e açúcar, mesmo em lar, não tem zero de adequado. Muitas vezes brinco com os doentes que me dizem: “Não uma vez que bolos, só caseiros”; “Só uma vez que bolachinhas de chuva e sal.” Costumo explicar que chuva e sal é mar, não é bolacha. Também há quem fale das bolachas integrais, que têm muita gordura, ou a bolacha de aveia. Aveia… aveia é saudável… mas a bolacha de aveia, frequentemente, tem 10% de gordura saturada, portanto está completamente desadequada. Depois é o biológico (muitas vezes, nem sabem muito muito o que quer expressar biológico ou orgânico) e o vegan.

É muito fácil as pessoas adotarem atitudes extremas. Uma deles é “o proveniente faz muito”. Quando falamos dos ultrapassados ou muito processados, aparece o outro extremo do tudo rendeiro, tudo proveniente. Dou sempre leste exemplo: o cianeto também é proveniente e mata

O que tem a expressar sobre os regimes vegetarianos?
Muitas vezes, os vegetarianos são indivíduos que têm mais preocupação, mais conhecimento nutricional e um estilo de vida mais adequado. O que não é a mesma coisa que expressar que, efetivamente, é o correto versus o não vegetariano.

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São os comportamentos desadequados que levam à inflamação de que tanto se fala?
A inflamação é, de facto, um denominador geral para a maioria das doenças de hoje. Já dizia o professor Sobrinho Simões: “Estamos todos muito inflamados.” A inflamação aguda é necessária, trata-se de uma reação contra uma agressão ou uma situação estranha, mas depois temos de ser capazes de resolver o processo inflamatório. A não solução significa a inflamação crónica de inferior intensidade.

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Porque não estamos a resolver isso?
Deve-se sobretudo à inadequação relativamente à gordura, que se reflete na falta de gordura Ómega 3, sobretudo os EPA e DHA, que estão maioritariamente na gordura do peixe, comparativamente à grande ingestão que fazemos de Ómega 6.

Onde se encontra o Ómega 6?
Principalmente, nas carnes e nos óleos alimentares. A proporção deveria ser de um de Ómega 3 para três de Ómega 6, mas o que acontece é de um para 20, ou seja, quando precisamos de uma reação inflamatória, vamos precisar desses Ómega 6, mas depois não temos os Ómega 3 em número suficiente para resolver o processo inflamatório.

Quais são as consequências desse desequilíbrio?
Se tenho menos ingestão, menos reservas dos Ómega 3, vou ter dificuldade de fazer essa solução. E uma vez que estamos com cada vez mais estímulos para a inflamação, ela vai acumulando-se de uns processos para os outros. Da neuroinflamação até à depressão major, passando pelo cancro e pela doença associada ao envelhecimento, já sabemos que tudo tem uma componente inflamatória.

De facto, está na base de tudo.
E ainda há a disfunção das mitocôndrias (a secção das células que mais contribui para queimar pujança), que está muito associada a variadíssimas doenças, do cancro à obesidade. Portanto, quase tudo vem de um processo inflamatório. Daí que os provisões antioxidantes e anti-inflamatórios sejam importantes do ponto de vista nutricional.

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Uma vez que podemos saber qual o nosso nível de inflamação?
Existem vários biomarcadores a que podemos recorrer, mas muitas vezes a revelação mais evidente do ponto de vista médico pode ser as doenças autoimunes, que são cada vez mais frequentes entre os 45 e os 55 anos. E isso vem exatamente desta confusão. Perante uma inflamação, o sistema imunitário fica altamente reativo e reage contra ele próprio. 

O que podemos fazer para termos uma “boa” microbiota, fundamental para a saúde?
A microbiota intestinal vai-se formando nos primeiros 2/3 anos de vida. Todos os fatores que atuam durante a vida intrauterina tem uma mandamento muito mais acentuada. Trata-se de uma tempo de muita vulnerabilidade e de oportunidades, em que também temos a formação do sistema imunitário, e que é influenciada por uma série de fatores – o tipo de parto, exposição ou não a antibióticos, quer durante a vida intrauterina quer durante o primeiro ano de vida, o tipo de sustento, o stresse, acontecimentos traumáticos, animais domésticos, vida rústico ou vida urbana e o tipo de dieta que se vai adotar do ponto de vista familiar.

A partir daí, quais são os fatores que influenciam a microbiota?
A atividade física, o stresse, a sustento e os medicamentos. Evidente que temos muita capacidade de resiliência, ou seja, de solução, se tivermos uma boa microbiota na primeira tempo da vida. Mas essa capacidade vai diminuindo, quanto maior for a agressão. Por exemplo, está mais do que demonstrado que a toma de um antibiótico vai modificar a microbiota intestinal. Isso pode resolver-se ao termo de 4/6 meses, sobretudo se tiver uma boa microbiota da primeira puerícia. Se não tenho, a capacidade de resiliência será muito menor e o impacto muito maior. Quem diz os antibióticos, diz muitos outros medicamentos, assim uma vez que a exposição crónica aos adoçantes não calóricos e aos emulsionantes usados nos produtos light quando se lhes retira a gordura. Há cada vez mais conhecimento de que existem muitos fatores que influenciam a formação deste órgão metabólico endócrino, que vai mudando muito ao longo da vida.

Que comportamentos alimentares erráticos mais comprometem esse órgão?
Só comermos provisões ricos em ligamento de vez em quando, uma vez que hortícolas, leguminosas, fruta e cereais. Se não ingerirmos os 25 a 30 gramas de ligamento por dia, de forma sistemática, as bactérias, que utilizam sobretudo esses ingredientes, não os vão encontrar, dando oportunidade para outros micro-organismos irem predominando. Temos cada vez mais a noção de que existe uma grande percentagem de proteobactérias na microbiota humana. Trata-se de um grupo patogénico que deveria ser unicamente 3% em todo a microbiota, e já encontramos indivíduos com 20 por cento.

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Uma vez que se chega a esse número?
Estas proteobactérias alimentam-se de proteína de origem bicho. E muitas vezes também pode ser consequência de medicação em que fazemos mal a digestão das proteínas.

A culpa está toda do lado da indústria?
Temos de entender que a indústria cevar e a farmacêutica não nos trazem só coisas más. Pelo contrário, a segurança cevar, a disponibilidade de provisões e de novas fórmulas mais adequadas às nossas necessidades é, sem incerteza, uma mais-valia. Confundimos isso com os ultraprocessados, com escolhas erradas. Uma vez que já disse, posso preparar um prato pleno de gordura, açúcar e de sal em lar, e ir comprar um comida processado interessante, uma vez que, por exemplo, um kefir ou um iogurte proveniente. Estes provisões fermentados são muito importantes na nossa sustento, mas muitas vezes também são veículos de açúcar ou de adoçantes, se tiverem olência. Ainda na semana passada fiz esse treino e encontrei um iogurte de morango com 5% de açúcar, mas evidente que também tinha adoçante para chegar ao ponto de mel que o consumidor exige atualmente. O do lado, de mirtilo, tinha 16% de açúcar.

Qual é melhor?
Nenhum dos dois. Devemos comprar iogurte proveniente.

E depois juntar-lhe os mirtilos…
Exatamente. Mas há muita desinformação sobre isto, o que gera um preconceito quanto ao processamento – quando cozinhamos, estamos a processar provisões. Agora, obviamente que a indústria vai fazer aquilo que a oferta procura. Só precisamos de um consumidor mais informado.

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O jejum intermitente é mau para nós?
Temos evoluído imenso na questão da cronobiologia, que dá relevância à hora do dia em que comemos. O jejum muito interpretado é aquele que me diz que devemos ter uma pausa cevar noturna. Mas as famílias fazem grande ingestão cevar na segunda metade do dia, que é o jantar, que já não é às sete, nem às oito, muitas vezes passa para as nove ou dez. E, depois, procuram a ressarcimento cevar, porque estão durante todo o dia com uma salada, depois de saltarem o pequeno-almoço. Se consumir à noite, vou lucrar tecido gorduroso e colesterol. Mas não se trata unicamente da questão da gordura, nem da resistência à insulina: consumir à noite, e ter picos de insulina e chegada de nutrientes às células, também bloqueia os mecanismos de limpeza celular, que identificam um erro e são capazes de o parar. A cronicidade destes maus hábitos acaba por resultar em mutações e em cancro, por exemplo.

Uma vez que deve ser a distribuição das refeições?
Ter uma boa primeira repasto, um bom almoço e depois reduzir a quantidade de provisões à noite, e sobretudo fazê-lo mais cedo.

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