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É preciso olhar “de forma mais humanizada” para o outro – Sustentabilidade

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Foto em cima: Filipa Alves Rocha, José Luís Roble, Nuno Abreu e Rute Dinis de Sousa participaram no debate “Um país a antidepressivos. O tabu da saúde mental nas organizações”. A moderação foi realizada pela jornalista do Negócios Filipa Lino.

As patologias de cariz mental integram cada vez mais o cabaz de preocupações das organizações, na medida em que, além do impacto direto na saúde dos colaboradores, podem afetar também a produtividade das empresas.

Na rombo da talk “Um país a antidepressivos: o tabu da saúde mental nas organizações”, promovida pela iniciativa Negócios Sustentabilidade 2030, Filipa Alves Rocha, responsável pelo departamento de Saúde Ocupacional na MC Sonae, começou por salientar que existe uma multiplicidade de doenças mentais e sintomas, mas há três sinais de alerta de que um tanto não está muito: “Em primeiro lugar, a perceção de que um tanto mudou em nós, estando mais irritados, mais tristes ou com falta de vontade de fazer o que fazíamos; além desta transição de estado, é a frequência com que isso ocorre, quando entramos num período em que isso começa a ser a normalidade; e também perceber que isto se vai agravando.”

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Devemos estar com uma atitude mais humanizada ao olhar para o outro. Filipa Alves Rocha,
Responsável pelo departamento de Saúde Ocupacional, MC Sonae

O isolamento, o comportamento ou a modificação no padrão das relações podem ser percecionados pelo próprio, pela sua rede pessoal, mas também pelos colegas de trabalho ou chefias. “Um colega que antes estava disponível para uma pausa de moca ou almoçar e agora não quer isola-se mais, está até mais contido no desempenho das suas funções ou o próprio olhar mais cabisbaixo mostra isso, se estivermos realmente atentos”, acrescenta Filipa Alves Rocha, sublinhando que, por isso, “devemos estar com uma atitude mais humanizada ao olhar para o outro”.

Filipa Alves Rocha evidenciou ainda o papel da saúde ocupacional das empresas, na medida em que o sítio de trabalho é onde o colaborador passa a maior secção do seu tempo útil. “O médico do trabalho é a pessoa que conhece o contexto, as relações, é a pessoa com quem os colaboradores têm à vontade para desafogar e muitas vezes é o primeiro pedestal que encontram”.

Em questões de prevenção e saúde mental a medicina no trabalho tem um papel fundamental. José Luís Roble
Diretor de Recursos Humanos, CUF

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José Luís Roble, diretor de Recursos Humanos da CUF, corroborou, referindo que “em questões de prevenção e saúde mental a medicina no trabalho tem um papel fundamental”. Destacou, no entanto, que poderá ser necessário dotar os profissionais de “mais expertise” sobre as doenças mentais para melhor identificarem casos. O diretor de RH assinalou também o papel das lideranças e dos colegas para partilharem com a medicina no trabalho casos que identifiquem nas suas equipas, porém, “levante estabilidade da privacidade e confidencialidade pode ser um ponto desafiante para a medicina no trabalho”.

Filipa Alves Rocha salientou a preço dessa sinalização, sublinhando que levante universo que liga empresa, colaboradores e medicina no trabalho deve ser colaborativo. “Não entrando em detalhes ou ultrapassando a esfera da confidencialidade, é muito lícito valorizar que alguém levante a mão e diga que está preocupado com determinado colaborador”, de forma a “terebrar portas para o médico fazer esse caminho”, referiu.

Portugal é o segundo país da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Poupado em consumo de antidepressivos e o primeiro em consumo de ansiolíticos. Tal justifica-se, segundo Rute Dinis de Sousa, psicóloga clínica e assessora para a Transformação e Relações Estratégicas da Novidade Medical School, pela desesperança que caracteriza a sociedade portuguesa na atualidade e pelo estigma que ainda existe sobre a saúde mental e pela perceção que cada um tem de falta de competências para mourejar com uma situação de problema mental. “O estigma e a falta de literacia fazem com que as pessoas atrasem a procura de ajuda, ou não a procurem mesmo, e o que acontece muitas vezes é um extremar de sintomas”, explica a psicóloga. Outrossim, existe ainda a perceção de que, tal uma vez que na saúde física, o problema tem de ser resolvido com medicamentos. Tudo isto faz com que haja uma “procura enorme de psicotrópicos, muitas vezes em automedicação”, alerta.

Rute Dinis de Sousa aponta também o dedo às organizações que ainda transmitem uma cultura de longas horas de trabalho e muita produtividade: “Por vezes, há um sentimento de culpa por se estar só a ler um regulamento e não a mandar um email e a mostrar que somos produtivos. Há empresas que têm intrínseco na sua cultura esta enorme exigência pela mostra de produtividade.” Daí ser necessário, junto das chefias e das organizações, “regularizar que as pessoas precisem de ler ou de ver outras coisas para aportarem mais ao seu trabalho”, acrescentou. Salientou também que se deve completar com a visão de que uma doença mental é uma fraqueza pessoal por não se ter conseguido mourejar com o nível de pressão e exigência.

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A liderança está a mudar

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Porém, também os próprios líderes adoecem com patologias mentais, tal uma vez que vieram a público revelar o banqueiro Quintal Osório ou o jurista João Vieira de Almeida, salientaram os intervenientes. “Isto tem um impacto fortíssimo e tem ajudado também as lideranças a mostrar um bocadinho a sua vulnerabilidade”, frisou José Luís Roble, destacando que se tem vindo a falar mais de lideranças mais empáticas.

Por sua vez, Rute Dinis de Sousa salientou que “há muitos líderes doentes e, por esse motivo, exercem também uma liderança promotora de doença”. Por isso, considera que “é preciso ensinar os líderes a liderarem para a saúde mental”, sejam eles líderes de topo ou intermédios. Por exemplo, devem-se traçar linhas vermelhas nas horas de envio de emails, recomendou. “O que não é prioritário deve esperar ou usar a tecnologia para programar a saída de emails.”

De salientar também que o líder acaba por definir um pouco a cultura da empresa com o tipo de comportamento que tem. “Numa empresa, as pessoas agarram-se mais às equipas e ao seu líder direto do que propriamente à liderança global, o líder é a referência”, sublinhou Nuno Abreu, diretor executivo da Aon Portugal. Por isso, e apesar de cada vez mais empresas estarem atentas às questões de saúde mental e bem-estar dos colaboradores, Nuno Abreu defendeu que promover líderes com históricos de workaholic dá o sinal de que “quem sobe e chega a um determinado nível são as pessoas que privilegiam uma vida de trabalho duro e são essas pessoas depois que são líderes de equipas”. Tal acontece porque, apesar de muitas vezes ser nessas equipas que existe mais absentismo e problemas de saúde mental, elas apresentam bons resultados financeiros. Porém, “se queremos ter uma empresa sustentável com um bom nível de bem-estar e saúde mental não podemos depois promover as pessoas que têm um comportamento contrário”, referiu.

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Para o líder da Aon Portugal, as empresas também podem olhar para a questão mental dos colaboradores de um “ponto de vista interesseiro”, na medida em que “as empresas precisam de pessoas com prontidão para conseguirem fazer coisas diferentes e estarem sempre a ser testadas e a trespassar da sua zona de conforto e isso só se consegue promovendo bons níveis de saúde mental”.

Nos tempos em que vivemos, para obter resultados, é necessário as pessoas estarem muito mentalmente. Nuno Abreu,
Diretor Executivo, Aon Portugal

Mesmo ao nível da retenção de talento, um estudo da Aon a nível global, com muro de 50 milénio colaboradores, detetou que 30% dos trabalhadores são resilientes E dentro deste segmento, 90% dos trabalhadores não queriam trespassar da empresa. Portanto, “quando olhamos para a falta de talento e de retenção, pessoas resilientes e que se sentem muito na empresa têm menos propensão a trespassar da empresa”, pelo que, “nos tempos em que vivemos, para obter resultados, é necessário as pessoas estarem muito mentalmente”, assinalou Nuno Abreu.

Instituições que se querem produtivas, economicamente saudáveis e sustentáveis não podem ter pessoas que estão doentes, porque estas pessoas não inovam e estão é preocupadas em sobreviver a cada dia. Rute Dinis de Sousa
Asessora para a Transformação e Relações Estratégicas, Novidade Medical School

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Mesmo para serem criativas, as pessoas precisam de estar muito mentalmente e de terem tempo para pensar. A psicóloga Rute Dinis de Sousa salientou que “quando temos reuniões todas de seguida não há espaço para pensarmos e nem para termos teoria nenhuma”. Por isso, “instituições que se querem produtivas, economicamente saudáveis e sustentáveis não podem ter pessoas que estão doentes, porque estas pessoas não inovam e estão é preocupadas em sobreviver a cada dia”. Portanto, “do ponto de vista estratégico, é do interesse das empresas investir na saúde mental”.

A pandemia ajudou a trazer o tema para a agenda das empresas, com os colaboradores a serem mais proativos sobre aquilo que querem e não querem na sua atividade profissional. Sobre levante aspeto, José Luís Roble salientou que “o tema do estabilidade é muito mais valorizado nas novas gerações”, sendo estas gerações aquelas que querem ver ações concretas para a promoção do seu bem-estar mental.

Apesar de se ter evoluído muito na perceção das doenças mentais, ficou também evidente que ainda existe qualquer estigma na abordagem destes temas. “Estamos a percorrer um caminho”, pelo que “trazer levante tema para dentro das organizações é uma ajuda enorme para fazermos na sociedade levante caminho de literacia”, acrescentou Filipa Alves Rocha.

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