No livro que acabou de editar escreve que temos uma “política de mão estendida” relativamente a Bruxelas. Acha que Portugal devia deixar de receber tanto numerário da União Europeia?
Não, não, não. O termo “política de mão estendida” é sobre subserviência. Acho que não temos que receber menos numerário. Mas temos que ter uma política mais proativa na União Europeia, fazer valer também os nossos pontos de vista. Não tem a ver só com a secção financeira, tem a ver com a secção em que, uma vez que nós estamos, uma vez que nós nos encontramos e qual a nossa participação na própria exigência da União Europeia.
André Ventura defendeu que o aumento das pensões em Portugal devia ser feito usando fundos europeus. Isso não é prolongar aquilo que labareda uma “política de mãos estendidas”?
Não. Somos cidadãos europeus, não é? A política de mãos estendidas é quando vêm dinheiros e depois não se sabe muito onde é que eles vão parar.
Portanto concorda que a equivalência das pensões ao salário mínimo devia ser paga por fundos europeus?
Acho que André Ventura disse isso de uma forma teórica. Esse tópico não foi estudado a fundo. Vamos estudar e vamos ver se é verosímil ou não. Pode não ser verosímil, não sei. A União Europeia paga tanta coisa, também pode remunerar isso, não é? É o bem-estar dos cidadãos da União Europeia.
Mas teriam de remunerar a todos os países, não é?
Depende dos sistemas sociais. Porque os sistemas da Segurança Social são diferentes de país para país. Portanto, nós temos um sistema de Segurança Social de um padrão um fatia dissemelhante. E, por outro lado, temos as pensões mais baixas da União Europeia, uma vez que sabe, no limiar da pobreza, e isso desculpa grandes problemas.
A Ucrânia deve fazer secção da União Europeia?
Acredito que sim.
Mas tem sido muito crítico do governo ucraniano. Chegou a partilhar um texto nas redes sociais onde dizia que a Ucrânia se apoiou, vou referir, em “confessados nazis, uma vez que os membros do Batalhão de Azov”. Um país que se apoia em nazis, uma vez que disse, deve fazer secção da UE?
Eu não escrevi isso.
Partilhou um texto onde se dizia isto, não foi? Não se lembra?
Por casualidade não me lembro. Tenho muito desvelo, até porque é um oração de que não sabor. Agora, efetivamente, o Batalhão Azov não era venerável, e tanto não era, que já desapareceu. Foram os próprios ucranianos que lentamente desfizeram o Batalhão Azov.
E a Rússia tem razões de queixa em relação ao que se passa na Ucrânia?
Neste momento, não tem razões de queixa nenhuma.
Mas já teve?
Eventualmente. Se antes disto tudo considerasse que as minorias russas não eram tratadas de congraçamento com aquilo que a Rússia queria, talvez. Não conheço essa região tão muito uma vez que conheço outras. Mas, a partir do momento que houve a invasão, a Rússia perdeu a razão toda.
Acha que a União Europeia e Portugal, naturalmente, deviam continuar a financiar o esforço de guerra ucraniana?
Acho que sim. Por um lado, do ponto de vista moral e ético, acho que sim. Do ponto de vista do diplomata, há uma coisa que me preocupa neste processo. Qual é a primeira preocupação de um diplomata, qualquer que ele seja? Evitar o conflito. Não foi verosímil. E a segunda preocupação do diplomata é concluir com o conflito. E aquilo que me está a ocasionar alguma mágoa, alguma tristeza, é que de facto não vejo esforços de negociações para concluir com o conflito. É um conflito que já dura há muito tempo. Não sei se há vencedores e vencidos, com toda a franqueza. O que é facto é que qualquer conflito em que se perdem vidas humanas é um mau conflito.
As sanções à Rússia foram mal aplicadas ou simplesmente não surtiram efeito?
Basicamente não surtiram efeito por uma razão muito simples: nós vivemos na Europa, vivemos numa bolha; e, entretanto, a Rússia virou-se para o outro lado, para a China, para a Índia, para o Brasil, para outros países que juntos têm três vezes o PIB da Europa.
Acredita ou não que deve ter um esforço de espeque à Ucrânia?
Sim. Se não houver um esforço de espeque, perde-se a capacidade negocial. É tão simples quanto isso. Ou seja, só tem capacidade negocial quem tem força negocial. Portanto, é preciso concordar a Ucrânia para que a Ucrânia tenha capacidade negocial.
O seu número dois, Tiago Moreira de Sá, escreveu que os Estados Unidos e a Europa têm de ir muito mais longe para dotar a Ucrânia do poder militar suficiente para forçar a Rússia a negociar. Concorda com esta certeza?
Concordaria se a Europa tivesse qualquer poder militar. Nós esvaziámos a Europa de poder militar.
Portanto levante esforço é inconsequente?
Os paióis europeus estão vazios. Que forças é que nós temos na Europa neste momento que pudessem usar os ucranianos? Quase zero.
Admite uma situação em que Portugal enviasse militares para o terreno na Ucrânia?
Mas quais militares? Se nós temos um problema em formar uma companhia para ir para a República Meio-Africana ou para ir para a Roménia, íamos mandar quem? Não temos.
André Ventura, em entrevista à CNN, admitiu um cenário em que Portugal podia enviar tropas em caso de extrema premência.
Sim, mas nós não temos… A nossa capacidade ofensiva neste momento está reduzida a algumas forças especiais. Tropas de combate nós praticamente já não temos.
Mas acredita que os vários membros da União Europeia devem enviar tropas para a Ucrânia?
Neste momento, não. Numa temporada ulterior, eventualmente.