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Considerada uma das capitais mais seguras e pacíficas da Europa, Lisboa viveu um dia de tumulto nesta quarta-feira (23). Mais de dez veículos, entre carros de polícia, ônibus e motos, foram incendiados na cidade e na vizinha Amadora, assim como cestas de lixo. As depredações ocorreram um dia depois da morte do cozinheiro cabo-verdiano Odair Moniz, alvejado por dois policiais.
Moniz, 43, era popular no bairro da Cova da Moura, em Amadora. Além de trabalhar num restaurante, era dono de um pequeno café que se tornou ponto de encontro. Aos sábados, servia cachupa, prato típico de seu país. De acordo com a polícia, ele teria recebido ordem de prisão e resistido, puxando uma faca. As circunstâncias da ação não foram esclarecidas. Sua morte causou revolta na região.
“Como muitas pessoas negras, Odair Moniz teve sua vida interrompida numa situação muito nebulosa, deixando viúva e três filhos”, diz António Tonga, 31, integrante do Coletivo Consciência Negra. “Exigimos uma apuração rigorosa e independente.”
Cova da Moura fica no que os moradores de Lisboa chamam de “linha de Sintra”, um trem que liga os dois municípios e corta a região onde há maior concentração de imigrantes. Segundo Tonga, seu coletivo foi fundado depois de um episódio ocorrido justamente nesse bairro, em 2015, quando seis jovens negros foram vítimas de violência policial. Depois de um processo que durou cinco anos, oito policiais foram condenados.
Os distúrbios começaram em lugares próximos à linha de Sintra. Segundo moradores disseram ao jornal O Público, policiais teriam tentado arrombar a porta e invadir a casa de Moniz, no dia seguinte à sua morte. A polícia nega a tentativa de arrombamento. Moniz havia respondido na Justiça no passado por tráfico de drogas –mas, de acordo com os mesmos vizinhos, não estava mais envolvido em crimes e fazia trabalhos comunitários.
Ao longo da madrugada, as depredações se espalharam por várias regiões, chegando até a bairros nobres da capital portuguesa, como o Campo de Ourique. A Polícia Civil (PSP) havia contabilizado ao menos quatro feridos, dois deles policiais; três pessoas foram presas.
Margarida Blasco, ministra da Administração Interna, classificou os distúrbios como inadmissíveis. O presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, disse estar “acompanhando atentamente” os fatos e fez um apelo para que se evitasse uma “escalada de violência”.
Em nota, a PSP afirmou que “repudia e não tolerará os atos de desordem e de destruição praticados por grupos criminosos, apostados em afrontar a autoridade do Estado e em perturbar a segurança da comunidade, grupos esses que integram uma minoria e que não representam a restante da população portuguesa que apenas deseja e quer viver em paz e tranquilidade”.
Integrantes de várias entidades do movimento negro marcaram uma reunião para a noite desta quarta, com o intuito de convocar uma manifestação pacífica contra a violência policial. A concentração ainda não tinha lugar marcado, e a data mais provável é o próximo sábado (26).
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