É muito curta, é muito estreita, estreitou o galeria BUS e coloca bicicletas a andejar em cima de passeios. É assim a novidade ciclovia da Avenida de Berna.
É curta: tem unicamente 220 metros de extensão numa avenida com perto de um quilómetro. É estreita, muito estreita: unicamente 1,80 metros de largura. Coloca os ciclistas a pedalar no passeio e a passar passadeiras, potenciando conflitos com peões. E obrigou à redução da largura do galeria BUS, apertando os autocarros contra as bicicletas. A Câmara de Lisboa está a modificar a ciclovia da Avenida de Berna para reduzi-la a um quarteirão e reintroduzir 70 lugares de estacionamento veículo – uma solução que procura estabelecer um compromisso entre utilizadores do coche e da bicicleta. Mas que, na verdade, é uma solução que esmaga autocarros, bicicletas e peões, sem prejudicar o veículo.
A obra na Avenida de Berna ainda não está concluídamas já dá para perceber o resultado da mediação em curso neste importante eixo, que liga a Rossio de Espanha à Avenida de República e que é uma das avenidas mais poluídas da cidadesegundo dados da autonomia.
O novo trajecto ciclável desenvolve-se unicamente no quarteirão da Gulbenkianentre a ciclovia bidireccional da Rossio de Espanha e o Largo Azeredo Perdigão. Neste ponto, o trajectória entra para dentro do bairro, permitindo chegar pelo já existente 30+bici da Avenida Elias Garcia à Avenida da República. Assim, os ciclistas deixam de ter uma relação directa, sem desvios, ao longo da Avenida de Bernasendo conduzidos, em vez disso, para corredores interiores e partilhados, onde não só são obrigados a relacionar-se com automobilistas (que nem sempre respeitam o limite de 30 km/h), porquê são forçados a tempos de movimento mais longos, devido à existência de vários cruzamentos semaforizados e dessincronizados entre si;
O trajectória passa a ter tapume de 440 metros. Perto de metade são metros partilhados entre bicicletas e peões; somente 220 metros são ciclovia propriamente dita – bidireccional, segregada, ao nível da estrada. Na verdade, as alterações realizadas neste eixo colocam os ciclistas em cima do passeio e a passar passadeiras tanto junto à Rossio de Espanha, porquê no Largo Azeredo Perdigão. Estas áreas de passeio partilhado podem proporcionar conflitos entre quem anda a pé e quem circula de bicicleta, principalmente devido à existência de alguns troços estreitos e de fraca visibilidade.
Recorde-se que a ciclovia implementada em 2021 tinha sido criticada por colocar peões e ciclistas em conflito. As alterações agora implementadas não só não resolveram esse problema, porquê intensificam essa situação, contrariando manuais e regulamentos. O Regulamento Municipal de Urbanização e Instituição de Lisboa (RMUEL), por exemplo, é muito evidente: “Deve evitar-se a simultaneidade com peões, exceto nas zonas de simultaneidade previstas no Código da Estrada, dando-se prioridade aos peões e evitando-se situações de conflito ou de anfibologia nas soluções de traçado de espaço público.”
Em relação ao troço de ciclovia propriamente dita, levante é estreito, muito estreito: conta com unicamente 1,80 metros de larguraconforme medições realizadas pelo LPP, o que é insuficiente para duas bicicletas se cruzarem de forma confortável e segura.
O Manual de Espaço Público da Câmara de Lisboa recomenda 2,40 metros de largura mínima para ciclovias bidireccionais, sendo que em situações ideais deverão ser 2,60 metros. Excepcionalmente, a ciclovia poderá ter unicamente 2,20 metros – mas não menos que isso. Também o Instituto de Mobilidade e Transportes (IMT) é evidente no seu manual: 1,80 metros não é uma ciclovia bidireccional segura e confortável para quem circula nela. O RMUEL também não deixa dúvidas quanto às “dimensões mínimas” dos percursos cicláveis:
a) 1,50 metros em percursos cicláveis unidirecionais, admitindo-se a título excecional um mínimo de 1,20 metros sempre que não seja provável a adoção do valor mínimo fluente e desde que se garanta a segurança dos utilizadores;
b) 2,60 metros em percursos cicláveis bidirecionais, admitindo-se a título excecional um mínimo de 2,20 metros sempre que não seja provável a adoção do valor mínimo fluente e desde que se garanta a segurança dos utilizadores;
c) 0,80 metros de via de proteção ao trajectória ciclável, admitindo-se, a título excecional, um mínimo de 0,60 metros, quando não seja provável a adoção do valor mínimo fluente e desde que salvaguardada a segurança dos utilizadores.
– Regulamento Municipal de Urbanização e Instituição de Lisboa (RMUEL)
Ciclovia estreita, buffer estreito, BUS estreito
A novidade ciclovia aperta os seus utilizadores uns contra outros num espaço de unicamente 1,80 metros de largura, mas também contra autocarros e restante trânsito motorizado. É que, por um lado, o amortecedor de protecção tem entre 0,30 e 0,40 metros, segundo as medições do LPP, o que é metade do que a própria Câmara recomenda.
Por outro, a diferença da ciclovia de unidireccional para bidireccional levou ao estreitamento da fita de rodagem com prejuízo para a via mais à direita, junto ao via ciclável. Esta via passou a ter unicamente 2,80 metrosconforme as medições que o LPP também realizou. Numa avenida porquê a de Berna, que está inscrita no PDM (Projecto Director Municipal) porquê de 2º nível, esta largura é proibido. Em qualquer eixo rodoviário de 2º nível, as vias de circulação devem ter um mínimo de 3,00 metros; e, se a via for BUS, porquê é o caso, a largura mínima é de 3,25 metros, a ideal é 3,50 metros. Não será, por isso, de estranhar que autocarros de 2,50 metros de largura tenham dificuldade em rodear naquele troço da Avenida de Berna, se não tiverem margem de manobra do lado esquerdo.
A obra agora realizada tem outros problemas, porquê deixar um dos pólos da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH), da Universidade Novidade, novamente desconectado da rede ciclável, ou proporcionar um trajectória mais longo aos ciclistas. Quem queira ir de Avenida da República à Rossio de Espanha por ali, em vez de um trajecto mais ou menos directo e unicamente com algumas interrupções semaforizadas, vai ter de parar três vezes em três semáforos demorados só para chegar ao Largo Azeredo Perdigão; e cá terá de passar quatro vezes quatro passadeiras – nem sempre apanhando verdejante –, para chegar ao troço segregado. No sentido contrário, o trajecto é também desconfortável, apesar de não obrigar a passar de bicicleta por tantos atravessamentos supostamente pedonais.
MUBi e ZERO intensificam queixa no Ministério Público
A MUBi, associação que defende a utilização da bicicleta em meio urbano, está preocupada com as alterações introduzidas na Avenida de Berna e acusa o Executivo de Carlos Moedas de “fazer uma desinformação de ‘veras opção’ ao declarar que finalmente está a remover a ciclovia da Avenida de Berna”mas a melhorá-la. A Câmara – refere a MUBi ao LPP – está a “retirar dois terços (2/3) da ciclovia e a propor, num terço (1/3) da avenida, uma ciclovia com dimensões ilegais e, ou por outra, a obrigar as pessoas em bicicleta a usar o passeio”. A associação diz ainda que, ao encaminhar as bicicletas para o passeio, retira-se que “esta obra nunca visou a segurança dos peões, mas unicamente repor espaço aos carros”.
Recorde-se que, juntamente com a associação ambientalista ZERO, a MUBi entregou no Ministério Público, no final de Outubro, uma queixa contra a Câmara de Lisboa pela obra na Avenida de Berna, alegando que viola o PDM, contradiz a estratégia da cidade e afasta-nos dos compromissos internacionais firmados pela autonomia. Agora, depois de ver os trabalhos no terreno, as duas associações decidiram apresentar uma adenda ao documento da queixa, tendo em conta as dimensões do troço de ciclovia que está a ser criado, e a aparente inexistência de um projecto de realização fechado e de Termo de Responsabilidade assinado por técnico competente, porquê é requerido em qualquer obra pública ou privada.
“Em suma: a obra em realização deixa 2/3 da Avenida de Berna sem qualquer infraestrutura ciclável e cria em 1/3 da Avenida uma ciclovia cuja largura nem se aproxima das dimensões regulamentares, ao lado de um buffer e de uma fita BUS também grosseiramente irregulares e insuficientes, colocando inequivocamente em transe quem circula de bicicleta na Avenida de Berna, tanto no troço ciclável agora executado quanto naquele onde não existirá qualquer infraestrutura ciclável. Existem fortes indícios de que a obra está a ser executada sem projecto fechado nem Termos de Responsabilidade assinados por técnico competente, face às sucessivas contradições por secção da CML e às irregularidades grosseiras que se observam no terreno”pode ler-se na adenda assinada pela MUBi e pela ZERO e remetida a 3 de Novembro ao Ministério Público. “Estes factos tornam a paragem da obra ainda mais urgente.”
A obra não parou. Continuou e deverá estar terminada agora no final de Novembro.
Câmara pode voltar detrás?
Entretanto, a Câmara de Lisboa parece atenta às críticas e disponível para rever o projecto. Numa enunciação à rádio Antena 1, a Directora Municipal de Mobilidade, Ana Raimundo, disse a 31 de Outubro que, “no projecto definitivo, vamos ter a extensão do trajectória ciclável em bidireccional até à Avenida da República, recuperando assim a bidireccionalidade e a separação da ciclovia em toda a Avenida de Berna”. Declarações que contrariam o projecto que era divulgado à data e que mostra uma ciclovia bidireccional entre a Rossio de Espanha até ao quarteirão da FCSH/Igreja. Dias depois destas declarações, numa reunião privada de Câmara, o Vice-Presidente, Filipe Cenobita Correia, responsável pela pasta da Mobilidade, desmentiu a diferença de planos referida por Ana Raimundo.
Posteriormente, numa conferência do jornal Público e da ZERO, a Directora Municipal de Mobilidade, esclareceu: “A ciclovia definitiva é um projecto que ainda está a ser desenvolvido e que vai ter consulta junto dos munícipes, por forma a podermos acomodar as sugestões de quem lá vive e de quem utiliza aquela ciclovia. O traçado ainda não esta completamente fechado. Temos estado a indagar se conseguimos por a bidireccional até à Avenida da Republica, mas ainda não esta fechado. Não posso manifestar se vai ser assim ou não.”
Questionado pelo LPP, manancial da Câmara de Lisboa confirmou que a “solução definitiva” para a Avenida de Berna está ainda a ser “desenvolvida” pelos serviços municipais, e que “não houve qualquer diferença de planos”. “Presentemente está em curso a reformulação da ciclovia, através de uma solução provisória, que permitirá implementar melhorias nas zonas de estadia do transporte público ao longo da Avenida de Berna, muito porquê na acessibilidade pedonal, em privado para as pessoas com mobilidade reduzida. Nesta primeira tempo serão também criadas zonas de cargas e descargas e bolsas de residentes em período noturno”informou ainda a autonomia. A solução provisória está a custar 62 milénio euros; já a definitiva, prevista para 2024, está estimada em mais 450 milénio euros. No totalidade, são meio milhão só a fazer e desfazer.
Posteriormente ter sido eleito, Carlos Moedas disse ser “muito importante” ter ciclovias e que as pessoas as usem. “Mas o que quero é ciclovias que sejam seguras”sublinhou na profundeza. “Eu teria receio hoje que os meus filhos usassem determinadas ciclovias.” O Presidente da Câmara decidiu, nesse sentido, encomendar uma auditoria a toda a rede ciclável da cidade à conceituada consultora dinamarquesa Copenhagenize – um trabalho que estará em tempo de peroração.
Mas, na Avenida de Berna, a autonomia decidiu seguir com a diferença da ciclovia sem a auditoria fechada, pressionada pela Junta de Freguesia das Avenidas Novas que quer a reposição do estacionamento removido em 2021. O resultado é um trajectória ciclável que não cumpre os manuais e regulamentos da própria cidade; uma ciclovia que aperta ciclistas, autocarros e peões, mas que deixa espaço para a circulação ou estacionamento veículo.