Confrontado pelos jornalistas, antes de uma arruada em Valença, André Ventura imitou exatamente o que Donald Trump faz frequentemente nos Estados Unidos para brigar os órgãos de notícia social, chamando aos jornalistas “inimigos do povo”.
Questionado sobre a manipulação feita do vídeo nas redes sociais, o líder do Chega acusou a SIC (propriedade a Impresa, também dona do Expresso), nestes termos: “Vocês ontem foram os inimigos do povo, os inimigos das pessoas. Ao partilhar uma peça mentirosa, falsa, a manipular as pessoas. Bastava estar a olhar para a memória, para a TVI e via-se a diferença”. Depois fazia a mesma delação, de forma mais generalizada.
Sem assumir a manipulação das imagens partilhadas por dirigentes do Chega, porquê a sua diretora de notíciaa deputada Patrícia Roble, André Ventura disse que a SIC fazia jornalismo “miserável” por não fazer o “jornalismo imprescindível”, que é “dar a resposta da pessoa que é confrontada. Já a TVI fez”. E qual foi a resposta de Ventura ao imigrante não citada? Não foi de conforto, mas que primeiro estão os portugueses. Eis a frase da resposta do líder do Chega ao imigrante: “Acredito que muitos portugueses não querem trabalhar no mar, mas esse é um problema da empresa. O Estado não pode estar a dar casas a outras pessoas quando não há para os nossos, percebe?”
Segue em grave a transcrição do diálogoocorrido esta quinta-feira, na Póvoa de Varzim, entre o imigrante e André Ventura – que tem instigado os militantes do Chega e os seguidores nas redes sociais contra a imigração com o grito “nem mais um!” O varão, refira-se, tinha limitações em expressar-se em português:
Iqbal: Tratei de visto, tenho tudo direitinho… pescadores da Indonésia são 85%, trabalho muito duro.
Ventura: Você trabalha na pesca?
Iqbal: Eu trabalho na estufa. Minha mulher não quer permanecer cá… Ela… dormir no embarcação, muitas pessoas reclamar. Eu não quero reclamar.
Ventura: Acredito que muitos portugueses não querem trabalhar no mar, mas esse é um problema da empresa. O Estado não pode estar a dar casas a outras pessoas quando não há para os nossos, percebe?
Iqbal: E porquê vai fazer isso? Sem pescadores porquê faz a pesca?
Ventura: Temos de ter uma pesca possante, mas temos de deixar que os direitos de todos sejam respeitados. Você não tem mansão é isso?
Iqbal: Não quero expor mansão, quero expor para outras pessoas… também para mim. Tinha cá filha, e mandei, eu estou muito triste [começa a chorar]mandei filha embora porque há muitas pessoas racistas…
Ventura: Compreendo… Eu não me vou olvidar.
A chorar e a falar português, Iqbal contou que está em Portugal há três anos, legalizado e documentado, explicando ter uma filha que nasceu no país, mas que mandou para a Indonésia para mansão dos avós maternos, por sentir hostilidade e racismo. O imigrante acusou o líder do Chega de populismo, de fomentar o racismo e de reclamar, mas de não apresentar soluções. Depois de a frota passar, e quando os jornalistas falavam com Iqbal, um dos simpatizantes do Chega gritou para os jornalistas: “Não lhes deem palco!” e “viva Portugal”.
Tal porquê outros dirigentes nas redes sociais, o líder do Chega ainda acusou, sem provas, o imigrante de estar a ser instrumentalizado “pela esquerda política que é quem mete estas pessoas todas à minha frente durante o tempo todo”. Quem conduziu o varão até Ventura foi um elemento da comitiva do Chega.
O Expresso perguntou a Ventura se estava a imitar Donald Trump, que já usou a delação aos jornalistas várias vezes: “Também já disse Deus supra de todos e não estou a imitar ninguém. Estou a expor aquilo que eu acho. E você está a imitar o Fernando Mendes por fazer perguntas assim?” Toda a comitiva achou muita perdão e aplaudiu.
Depois das declarações de André Ventura, os jornalistas pediram ao cabeça de lista, Tânger Corrêa, para esclarecer a frase do dia anteriorquando apelou para “toda a gente votar no único partido que não vai para Bruxelas tutelar os animais, as vegetação, os jardins ou eles próprios.” O mensageiro, que sempre teve cães, alega que “ninguém gosta mais de animais” do que ele, mas não revelou o mira das suas críticas, porque não faz uma campanha “a insultar toda a gente”. Em dia de atirar aos jornalistas, o candidato seguiu o exemplo do líder e rematou assim a última arruada da campanha, quando questionado sobre se acreditava nas alterações climáticas: “Isso é pergunta que se faça? Se quisesse ser repugnante diria ‘olhe, vá perguntar aos cãezinhos que eles logo lhe responderão’”.