Se pensarmos que “o paixão é incêndio que arde sem se ver” ou dizemos que somos “de músculos e osso”, isso convida ao poeta maior da Língua Portuguesa. Quando saímos andando “por éguas nunca de antes navegadas” ou afirmamos que “outro valor mais cima se alevanta”, é das palavras de Luís Vaz de Camões que fazem as nossas. O Porto celebra os 500 anos do promanação de Camões com uma exibição, nos Paços do Concelho, da primeira edição de “Os Lusíadas”, mas também com um projeto que fará a poema repetir nas vozes de diferentes gerações de portuenses.
“Oriente livrinho é a joia da diadema do Ateneu [Comercial do Porto]”, assume o seu presidente para partilhar a história daquela que será um de entre 34 exemplares que se julga ainda existirem da edição de 1572 da obra de trova épica.
Rogério Gomes conta que o livro foi adquirido “num leilão feito numa leiloaria que havia em Passos Manuel, por 170 milénio réis”. Restaurado nos anos 70 e sempre “preservado pelo Ateneu”, o réplica foi meta de um estudo “que o classifica porquê ‘edição pura'”, por ter sido um dos primeiros a trespassar do prelo.
Considerando a existência de “uma espécie de torpor, de temor osco de indiferença que, hoje, define a relação dos portugueses com o poeta e a sua obra”, o diretor do Museu e Bibliotecas do Porto sublinha porquê a Invicta, “assumindo o seu regimento e a sua responsabilidade enquanto cidade literária, coloca um foco de luz principalmente simbólico sobre Camões e sobre esta obra transformadora, profundamente moderna, que criou uma espécie de trajectória em torno da qual passou a remoinhar toda a literatura de Língua Portuguesa”.
No dia (23 de janeiro) em que se assinalam “os 500 anos sobre a data e o ano prováveis do promanação de Luís Vaz de Camões”, “essa figura enigmática, contraditória, transformadora, poética, trágica, épica”, Jorge Sobrado afirma que as comemorações assumidas pelo Porto “contrastam com qualquer esmorecimento destas comemorações” no país, procurando “reinscrever esta obra e levante responsável nos interesses, nos hábitos de leitura, na curiosidade e no espanto dos portuenses e dos portugueses”.
Camões na cidade do Porto
E essa poema será percorrida através de um projeto com curaria de Gonçalo M. Tavares. O repórter propõe-se “partilhar ‘Os Lusíadas’, as suas 1102 estrofes, por 1102 cidadãos ao casualidade”, com o sorteio de ter uma garoto de sete anos a ler “As armas e os barões assinalados”a primeira estrofe, e uma pessoa de 87 anos a terminar a leitura, em “Sem à dita de Aquiles ter inveja” para que “possamos seguir gerações sucessivas a ler o mesmo livro”.
As gravações serão, depois, espalhadas pela cidade (acessíveis através de códigos QR). “Os dez cantos d’ Os Lusíadas estarão em dez cantos do Porto”, explica Gonçalo M. Tavares, sublinhando a lógica de “além de chamarmos a comunidade, também o próprio território aplicável”. Quem quiser fazer secção da leitura coletiva, poderá inscrever-se através do endereço de correio eletrônico camoes500anos@cm-porto.pt.
Poeta do encantamento a quem se regressa dissemelhante
Recordando porquê estudou a obra na escola e ganhou “uma grande alergia”, o repórter atualmente-a “insuportável”, sentindo a premência de se distanciar. Mas o revinda, dez anos depois, mudou tudo.
“A vocábulo ‘encantar’ tem a ver com entrar num esquina. E Camões é absolutamente encantatório. Tem a ver com o que está a ser cá, mas também com a questão músico. E é esse o encantamento. O que Camões faz é manifestar coisas fortes com um ritmo absolutamente insólito. Por isso, o seu esquina tem esta potência de, 500 anos depois, estarmos a falar dele”, sublinha o curador do projeto.
Gonçalo M. Tavares acredita que se vai “perceber que estamos perante canções maquinalmente sedutoras e que põem a Língua Portuguesa num patamar absolutamente inultrapassável”.
O repórter não deixou de referir a “desatenção incrível em relação aos 500 anos de Camões”. Por isso, “fico muito contente que o Porto esteja, ao contrário dos desatentos, muito vigilante”.
O esboço para levante “Camões na cidade do Porto” surgiu numa conversa com o diretor do Coliseu. Miguel Guedes recorda que “estudamos, olhamos para o que escreveu, analisamos, até, uns por paladar, outros por dor, o que nos entrega naquelas alturas em que ele consta dos testes, mas depois não passa no teste da veras, esfuma-se”.
O realizador confirma que a teoria era “trazer Luís Vaz de Camões para as pessoas, para as ruas, democratizar, tornar menos críptica esta vivência”. “Nós [Coliseu] começaremos e encerraremos esta democratização do poeta” na cidade que “melhor o poderá receber”.
Por locais nunca antes visitados
Além deste livro vasqueiro, o Município exibe duas edições antigas da mesma obra, que integram o espólio da Livraria Pública Municipal do Porto: uma de 1817, impressa e publicada em Paris em 200 exemplares, e outra, de 1880, produzida por um fotógrafo teutónico , radicado no Porto.
As portas dos Paços do Concelho estarão abertas a todos entre os dias 24 e 28 de janeiro, das 9 às 17 horas, conforto, ainda, uma oportunidade para circundar “por éguas nunca de antes navegadas”ou seja, pelos salões que compõem o prédio, normalmente fechado ao público.