À falta de uma oposição política tradicional, a objecção ao regime veio das Forças Armadas, que vinham engajadas em guerras para tentar manter as possessões coloniais na África a partir dos anos 1960, simultaneamente em Angola, Guiné-Bissau e Moçambique. Um em cada quatro portugueses em idade de servir ao Tropa entre 1967 e 1974 transferidos na África. Eram guerras perdidas, caras e inúteis, já que regimes coloniais vinham sendo substituídos por nações independentes no continente.
Foi o ressentimento da bucha de canhão – militares engajados em guerras coloniais em nome de um governo impopular e sem voto – que deflagrou o movimento dos capitães de abril de 1974. A derrubada do regime permitiu a volta dos exilados ao país e a reorganização das forças políticas – primeiro numa “junta de salvação vernáculo”, retirada depois de eleições.
Por qualquer tempo, temeu-se que o país caísse na trajectória de Moscou, mas decisões equivocadas dos comunistas que integravam o governo provisório, porquê tentativa de coletivização de terras no setentrião do país, reduziram seu base nos meses seguintes. Em 1975, os comunistas tiveram menos votos que a centro-direita num pleito em que o grande vitorioso foi o moderado Partido Socialista, liderado por Mário Soares.
Em 1986, porquê os socialistas locais já tendo deserto a retórica anticapitalista, Portugal foi recebido na Comunidade Econômica Europeia – embrião da União Europeia – no que foi uma opção rigorosa pelos primados da democracia e da economia de mercado, que prevalecem até os dias atuais.
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Está na Netflix a série portuguesa “Glória” (2021), que conta a história de Raret, uma operação montada pela CIA durante o regime salazarista para transmitir propaganda política para o conjunto comunista. Uma cidade montada pelos americanos em torno de potentes antenas de transmissão, em uma região remota do país, existe mesmo, mas é ficcional que um de seus funcionários seria espião da KGB, o que dá o argumento da série. É uma lição de salazarismo: Pide, tortura, guerras coloniais, êxodo, pobreza.